terça-feira, 29 de março de 2011

12 MESES COM VIKTOR YANUKOVYCH

Vysokyi Zamok, 24.02.2011

Ivan Farion

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Tentativa de resposta às questões sobre a efetividade do desempenho do atual presidente perante a nação ukrainiana.

Viktor Yanukovych - Presidente da Ukraina

25 de fevereiro o atual e quarto presidente desde a independência da Ukraina aparecerá nos principais canais da televisão nacional em duas horas de "Conversando com o país". Prestará contas à nação sobre o que conseguiu, em um ano de trabalho, como dirigente do país. Não há dúvida que, de sua boca, ouvir-se-ão, principalmente, relatos vitoriosos, ao lado de "algumas falhas". Prognosticamos que ressoarão no ar encomendados cumprimentos de regiões, como que "agradecemos, apoiamos, aprovamos!". Entretanto, a maioria dos ukrainianos tem uma visão diferente sobre a atuação do atual presidente.

 
Ataque de Buldôzer

Viktor Yanukovych entrará para os manuais políticos como governante, o qual com "leve movimento da mão", sem pedir o consentimento dos eleitores, concentrou em suas mãos, inteiramente, todo poder. Poucos dias lhe foram suficientes para esmagar toda Reforma Política de 2004 e tornar-se "tzar" plenipotenciário. Pelo caminho de manipulações jurídicas formou "sob seu comando" a maioria parlamentar que o compreende a um olhar severo e, obediente, realiza absurdos comandos. O Parlamento deixou de ser independente, auto-suficiente e prestigioso órgão de Estado.
O Parlamento orienta-se pelo aceno do dirigente dos "regionais" (partido do presidente), Chechetov, que recebe a "partitura" cada manhã do gabinete presidencial.
Os políticos vendáveis tornaram-se respeitáveis. No léxico político estabeleceu-se a palavra "tushka" ("carapaça", assim denominados os políticos que, individualmente abandonam seus partidos e ingressam no partido dominante - O.K.).
Mesmo o aparentemente crítico ao governo "buldôzer", Leonid Kravchuk (primeiro presidente após a independência - O.K.) rebatizou-o de "estável" e iniciou os trabalhos para o aperfeiçoamento da já rasgada em pedaços Constituição (encarregado pelo presidente - O.K.)
Yanukovych transformou o Tribunal Constitucional em órgão auxiliar onde todas as decisões importantes são tomadas com orientação da Administração Presidencial. Muitos antes dos juízes entrarem na sala do júri os "locutores" do Partido das Regiões já sabem qual será o texto da decisão. Subalternos da Administração Presidencial tornaram-se a Procuradoria Geral, o Serviço de Segurança da Ukraina, o Ministério do Interior. Conforme ordem publicada até o brutal espancamento de deputados qualificam como equívoco. . .
Os amigos, naturais de Donetsk (província do presidente) ocuparam todos os postos-chave no país. Sob a égide presidencial a Procuradoria Geral da Ukraina, o Conselho Superior da Justiça, o Banco Nacional e outras instituições. No aparelho do Estado floresce o nepotismo característico de regimes "bananeiros".
O comando do Yanukovych tomou a igreja para seu "patrocínio". Demonstra atitude reverente e dá preferência, exclusivamente, a uma única confissão, cujo requisito é a palavra "moskovita". A Oração da Manhã na TV estatal é transmitida no idioma "compreensível a todos" (russo - O.K.)
Houve a tentativa de apossar-se até do comando superior do futebol. Apenas a advertência ameaçadora das apolíticas FIFA e UEFA paralisaram o pretendido. Pelo menos até julho de 2012, até a realização da Copa Euro.
Ukraina, junto a Yanukovych, segundo exemplo da Rússia, se converterá em país com "democracia dirigida". A brutal pressão é aplicada a todos os opositores do governo. Eles são intimidados com as chamadas para "conversas" repetitórias às promotorias, isolamentos na prisão, pressão sobre parentes e amigos. Aprisionaram, entre outros, o ex-ministro do Interior, o qual assinou um documento profissional discutível e ofereceu flores às viúvas de policiais, mas liberaram, apenas com assinatura de não ausência do país, o filhinho de deputado, o qual afogou uma pessoa amarrando-lhe nas costas uma bateria de aquecimento central . . .
Dos principais canais de TV desapareceu ou se tornou regulada a avaliação das ações do governo. Em contrapartida apareceu mais entretenimento. "Viver ficou melhor, mais divertido!".
Os meios de comunicação que se atrevem a chamar os bois pelos nomes, correm o risco de desaparecer. Temos uma história sem precedentes de cassação das licenças do "Canal 5" e "TVi", processos judiciais contra jornalistas e uso de força física contra eles. Um deles, jornalista de Kharkiv Vasyl Klymentiev, o qual "guiava para águas claras" o governo local, não conseguem localizar a mais de seis meses. O assassinato de G. Gongadze (jornalista assassinado há mais de dez anos e cujo corpo foi encontrado sem cabeça), no interesse de seus aliados políticos, deixou de ser considerado crime encomendado. Na avaliação da liberdade de expressão a Ukraina caiu 42 posições, encontra-se abaixo de Iraque. Denominam-nos país "parcialmente livre".
Com uma só canetada o presidente prolongou em 1/4 de século a permanência de tropas estrangeiras (russas) e, em troca de ilusórios benefícios desfez-se de urânio altamente enriquecido.
O compasso do governo ukrainiano constantemente aponta para o nordeste. Até soam apelos para adotar o horário de Moscou (já não é mais de acordo com o Sol? - O.K.)
Para satisfazer os vizinhos, os zelosos funcionários ukrainianos reescrevem a história, lutam com os heróis. Mas ficam mudos quando Kremlin humilha os ukrainianos, declarando que, mesmo sem eles teriam vencido a II Grande Guerra, (desrespeito aos muitos que faleceram nos campos de batalha -O.K.) quando liquidam as organizações e bibliotecas ukrainianas. Pela destruição do busto do líder totalitário (busto de Stalin, na Ukraina. O governo ukrainiano colocou pessoas atrás das grades e aplicou torturas físicas machucando-as e deixando sem atendimento médico até as feridas tornarem-se purulentas. Pessoas apenas suspeitas - O.K.), mas nunca acha os destruidores dos obeliscos em memória do Holodomor (morte pela fome, em 1932-1933, genocídio contra nação ukrainiana, protagonizado por Stalin e que exterminou, aproximadamente, 7 milhões de ukrainianos - O.K).
O idioma ukrainiano anda desprestigiado. É desrespeitado e insultado mais do que nos tempos da União Soviética. É chamado de língua de "gado".

Palavras vazias sobre o direito dos pobres . . .
Um ano atrás, em seu discurso de posse, Viktor Yanukovych prometeu melhorar a vida de todos. Agora o governo fala sobre o crescimento do PIB em 4,5%, redução de 15% para 5% do déficit orçamentário, aumento de 30% nas exportações, redução da inflação de 13% para 9%.
No entanto, o investimento estrangeiro caiu de 40 bilhões em 2009 para 6 bilhões em 2010 apesar da assinatura do Tratado Naval e anunciado desconto do gás russo que acabamos pagando mais que antes para nação "irmã". Moscou deu desconto no preço do gás . . . para Europa Ocidental, mas para Ukraina "esqueceu". (Por mil m³ Grã Bretanha paga 190 dólares, Alemanha e França 270, Ukraina 264 - O.K.).
Aumentou o preço dos combustíveis, subiram as tarifas comunais, assustam as pessoas com multas e juros - embora a qualidade dos serviços não melhorou.
Ao atraso dos salários adiciona-se o não pagamento das licenças médicas. Já está pronto o projeto para cassação de bonificações de 16 categorias de cidadãos, incluindo os sobreviventes de Chernobyl, os inválidos, os veteranos de guerra, os trabalhadores de profissões perigosas. O governo assustou a nação com uma repentina reforma na aposentadoria e Códigos discriminatórios de Trabalho e Habitação.
Anteriormente Yanukovych acusava seus antecessores por causa da crise do açúcar e da carne, mas sua equipe provocou pânico devido a falta de óleo, trigo (sempre foi uma grande riqueza - O.K.) "hrechka". (Uma espécie de trigo - no Brasil praticamente desconhecido. Minha mãe preparava com leite, tipo mingau. Não sei como fazem na Ukraina, outro dia li que na falta deste produto estão passando para o arroz que é importado, portanto caro. Estão importando "hrechka" também - O.K.). Grande alta de preços nos remédios. . . E isto, apesar das promessas de proteger os alimentos essenciais e remédios das flutuações de mercado. Os peritos concordam que o nível de inflação no atual Gabinete Ministerial deliberadamente escondem.
Viktor Yanukovych prometeu, aos pequenos e médios empresários, moratória em relação aos impostos, mas preparou uma verdadeira "forca". Levados ao desespero eles acamparam nas praças, mas suas principais reivindicações não foram ouvidas. Durante o evento o governo ameaçou os empresários de transporte para que não fornecessem ônibus a Kyiv, evitando assim grandes manifestações na Capital. Ao término iniciou-se o interrogatório nas promotorias aos que mais se destacaram na organização.
Yanukovych prometeu realizar uma reforma administrativa, encurtar o aparelho governamental, mas apenas mudou os funcionários para outras cadeiras - com os mesmos salários e benefícios.
Fecham-se escolas em aldeias, "otimizam-se" os serviços de saúde. Por exemplo, a alguns meses, para os habitantes da aldeia Beresdivtsiv, em Lviv, a ambulância precisava percorrer um quilômetro, agora este caminho tornaram sete vezes mais longo.
"Melhoria de vida hoje" ocorre na esplendorosa vivência de pessoas-vip. Última notícia - na reforma de apenas uma residência presidencial, em Huti, Ivano-Frankivsk, gastaram 33 milhões de "hrevnhakh (moeda local). Mais de 100 mil custou o aluguel do vagão no qual viajou o presidente em sua visita a Tóquio, 16 milhões de dólares pagaram pelo helicóptero para uso presidencial. Milhões foram gastos para preparação de pracinhas para este helicóptero. Dois milhões para estacionamento dos carros oficiais. E, nós ainda lembramos-nos de 135 hectares de área preservada "Mezhyhiria", da qual o presidente apropriou-se e onde, além de diversas construções e marina no rio, cria avestruzes . . .
Para Yanukovych algumas pessoas olham entusiasticamente, outras com medo e desilusão. Para alguns ele agrada quando franze as sobrancelhas, outros enrubescem quando ouvem suas confusões geográficas e suas "pérolas" literárias. Alguém diz que foi Deus quem enviou-o à Ukraina (diretor teatral russo Mykyta Mykhalkov, e alguém acredita que Ukraina não teve sorte com o quarto presidente. Para confirmar ou refutar essas estimativas Viktor Yanukovych tem mais quatro anos.

Tradução: Oksana Kowaltschuk
Fotoformatação: A. Oliynik

sexta-feira, 25 de março de 2011

O QUE É "MUNDO RUSSO"? - “Рускій мір”?

05.03.2011
Ihor Losyev
O que é “Рускій мір”? - ("Mundo russo")?

Quem hoje vai determinar o valor do "Mundo russo?" Evidentemente, isso só pode acontecer na Rússia, e somente no Patriarcado de Moscou e algumas outras estruturas como a Administração presidencial, o FSB (Serviço Federal de Segurança), SVR (Serviço de Inteligência Externa), GRU (Direção Principal de Inteligência) etc.
A civilização russa na verdade tem certas características que a impedem assemelhar-se à Europa ou Ásia, porque tem traços de Bizâncio, considerados por muitos russos cultos, até hoje, como matriz original de sua cultura e história.
Bizâncio, como sabemos, era um Estado ideocrático onde a ideologia era fundamental nas decisões, muito mais importante do que a vida real. Os aspectos simbólicos dominavam a pragmasticidade. A ideologia era o sustentáculo, mas o chefe de Estado tinha a palavra final em todas as disputas ideológicas. Rússia herdou inteiramente essa primazia da ideologia bizantina sobre a vida, especialmente quando o Estado, na pessoa de seu líder, e sua igreja oficial, se apresenta como principal e único ideólogo, que não aceita concorrência e, na melhor das hipóteses poderá apenas aceitar a existência de concorrentes puramente marginais.
Os "Tzares" russos tinham precedência em relação aos metropolitas e patriarcas da igreja russa, o que inteiramente inseria-se no esquema bizantino do "cesarepapismo" (reciprocidade entre o governo do imperador e igreja em Bizâncio, quando, de fato, o imperador também era o presidente da igreja - O.K.). Era o "Tzar" moscovita que decidia quem estava com a razão, neste ou naquele conflito ideológico. Depois de Pedro I, quando os russos tomaram conhecimento que existe um outro mundo ocidental, com tendências seculares (divisão da existência social em duas esferas de igualdade de direitos - laica e espiritual), a igreja, como co-autora da autoridade "tzarista" no reino ideológico foi deslocada para segundo plano, o que, principalmente, foi acusado pela cassação do Patriarcado de Moscou e sua substituição por Santíssimo Sínodo sob o controle total do Estado. Isto privou, por determinado tempo, o já império de Petersburgo da ideologia ortodoxa imperial da anterior totalidade. Por isso, no início do século XIX foi formulada uma nova e fundamental ideologia de sincretismo religioso - estatal: "ortodoxia, monarquia (absoluta), povo. (Seu autor foi o Ministro do Ensino conde Uvarov).
Depois de 1917, no bolchevismo, a totalidade da ideologização na vida da Rússia vermelha alcançou a esfera mais ampla. A versão russificada do marxismo assumiu a missão de esclarecer tudo para a vida dos súditos do império comunista. Essa ideologia fundamentava cada passo não apenas no interior do país, mas também todas as ações da URSS no mundo. Todo líder do partido comunista deveria ser também seu maior teórico, que "criativamente fomenta o marxismo-leninismo". Os lideres menores também deviam ser ideólogos de menor calibre e, portanto, obrigatoriamente, tinham consigo um livro, não escrito por eles, ou pelo menos uma coleção de textos de seus discursos ou apresentações públicas, sobre o marxismo. O poder político da URSS era impossível sem a auréola ideológica, sem participação da "ideocracia de tradições sagradas". No entanto, na União Soviética o centro ideológico devia ser único, sem permissão para nenhum centrismo político. Precisamente a ideologia, ao lado da violência por parte dos funcionários específicos, e da enorme máquina burocrática mantinha o império comunista, de etnias extraordinariamente diversas, da segregação.
Orfandade ideológica do pós-comunismo russo
Após 1991 tornou-se claro que a Federação Russa tendo mísseis, funcionários específicos, nafta e gás, não tinha um sistema totalmente ideológico que justificasse este Estado e sua aspiração para uma desenfreada expansão externa, em primeira etapa, entre os limites territoriais da antiga URSS. A presença do caos ideológico, divergência de opiniões, concorrência de idéias, que é norma numa comunidade democrática, essencial para uma formação cadenciada de idéias e consenso, assustava os russos (e não somente os governantes). Isso era absolutamente insólito, pois em toda sua história secular, Rússia viveu não mais que 20-30 anos de liberdade ideológica. E estes poucos anos consideravam-se em historiografia, na maioria dos casos, como ruína.
Aos russos parecia, e parece que a liberdade espiritual é extraordinariamente perigosa e pode conduzir à desintegração da Rússia, como aconteceu com a União Soviética.
Bóris Iéltsin exigia dos políticos e cientistas conceberem a idéia nacional russa. Era necessária a mais alta sanção ideológica para todas as etapas práticas do Estado russo para criação do próprio neo-império, potente centro de força na arena mundial. O que poderia vir a ser fundamental para tal complexo ideológico? Certamente não faliu a idéia comunista. Nem o nacionalismo russo na aparência genuína, porque ele criava problemas nos territórios nacionais da própria Rússia, não mencionando os Estados vizinhos.
Muito perspectiva se apresentou a global e nacionalista idéia do "Mundo russo". Ela deve ser nacionalista para os russos étnicos e supranacional para os não russos. Como maior propagandista desta idéia projetou-se o Patriarca de Moscou.

Ações de conquista do Patriarca Cirilo

Putin (C) Patriarca Cirilo (D)
Segundo o pensamento do líder da Igreja Ortodoxa russa, anunciado na IV Assembléia do "Mundo russo", o "Mundo russo" é uma civilização única, não é ocidental nem oriental, e se contrapõe a todas as outras na ideologia, mentalidade e ética. São estes três elementos que persistem pela fronteira invisível entre ele e outros "mundos". Entretanto, geograficamente e historicamente este "mundo" prende-se não a outros territórios étnicos russos, mas a Kyiv e Dnipró. É como se fosse justamente aí, há mil anos, no pensamento de Cirilo que tivesse nascido este "Mundo russo". É a tentativa de imposição da atual rede de idéias político-culturais russas a Ukraina atual convertendo-a em robô de subsistema do sistema russo. Nesta ideologia neo-imperial tudo se constrói no subsolo de todo o sistema de mitos históricos.
O Patriarca de Moscou, não obstante dados históricos, novamente produz o quadro do nascimento da Rússia... nas margens do Dnipró.
E o esquema virtual-globalista do "Mundo russo" é propenso a dissolver completamente a Ukraina e tudo o que é ukrainiano (como a Bielorrússia e tudo o que é bielorrusso) na imensidão russa. Ele novamente, como nos tempos do império russo e URSS identifica a idéia "ruskyi" e "rosiyskyi", "Rus" e "Rússia"¹. Entretanto faz certa cortesia para o lado ukrainiano para entrar em acordo, porque atualmente a identificação no estilo Karamzin (historiador russo, 1766-1826) parece muito cômica.

Nikita Khrushchov
Neste "Mundo russo" a Igreja Ortodoxa russa deve distinguir-se com a peculiaridade de policial ideológico e carcereiro que não reconhece fronteiras. Neste papel, de acordo com Cirilo, a sua igreja tem a sanção diretamente de Deus. Em outras palavras trata-se de uma estrutura "escolhida por Deus" que atribuía a si o direito de dispor do destino histórico de outros povos e países. Particularmente causa impressão a frase do dirigente da Igreja Ortodoxa russa do Patriarcado de Moscou (ROC-MP): Nós definimos o que é bom ou ruim com base em valores do "Mundo russo". Isso lembra bem as palavras de Lênin no Terceiro Congresso do Komsomol russo: "É moral tudo o que serve à causa do proletariado". Mas então, como agora, a pergunta é: quem define exatamente o que serve, e o que - não? Primeiramente isso definia Lênin, depois Stalin, depois Nikita Khrushchov, e depois Leonid Ilyich Brezhnev.

Leonid Ilych Brezhnev
Quem hoje vai determinar o valor do "Mundo russo?" Evidentemente, isso só pode acontecer na Rússia e somente no Patriarcado de Moscou e algumas outras estruturas como a Administração presidencial, o FSB (Serviço Federal de Segurança), SVR (Serviço de Inteligência Externa), GRU (Direção Principal de Inteligência) etc. Mas o hierarca da igreja e bispo cristão, se ele serve a Cristo, não a César (ou quer ser o próprio César) não deveria assumir os valores ideológico-geopolíticos, e sim os valores do Evangelho.
Aqui nós vemos tentativas de criar uma superestrutura russa com rígido controle político e ideológico dos Estados recentemente independentes da antiga União Soviética, e se levar sorte, até mesmo sobre os Estados da península dos Bálcãs. É o desejo ideológico-político sobre os países vizinhos, e esta sede de dominância não conseguem ocultar as doces palavras do Patriarca Cirilo. As diligências do Patriarca mais uma vez convencem: Rússia absolutamente não pensa em se tornar democrática, ela pretende permanecer autoritária e despótica. E todas as declarações sobre "democracia e soberania" destinam-se apenas para enganar a opinião pública mundial. A perspectiva de criação do "Mundo russo" obriga lembrar os 70 anos de formação do "povo soviético", e seu resultado final.
(¹) "Rus" - antigo nome da Ukraina, do qual Rússia se apoderou, transformando-o em Rússia. Ver o artigo anterior: Gênese da Ucrânia). "ruskyi" - natural da "Rus" "rosiyskyi" - natural da Rússia.

Tradução: Oksana Kowaltschuk
Fotoformatação: A.Oliynik


quarta-feira, 23 de março de 2011

BYKIVNIA


Bykivnia é uma aldeia localizada a noroeste de Kyiv. A origem do nome é desconhecida.
Nesta aldeia, nos anos 1930 e início dos anos 1940, antes da ocupação de Kyiv pelos alemães, foram criadas condições para realizarem-se aí, enterros em massa de pessoas represadas e executadas em Kyiv, pelos órgãos de NKVS (órgão anterior a NKVD), que funcionava em 1937-1938, os anos do Grande Terror.
O órgão local, responsável pelos aprisionamentos e destino dos presos geralmente compunha-se de três pessoas da província sob a orientação geral de Mykola Yezhov (Yejov).
Visava os antigos "kurkuli" (aldeões, ex-proprietários de terra nas aldeias), malfeitores e todos os que, de alguma maneira se opuseram, ou poderiam vir a se opor (pessoas mais esclarecidas nas comunidades) ao domínio soviético. Também o clero rural e antigos participantes de partidos de oposição.
As sentenças compreendiam duas categorias: fuzilamento e envio para os "gulags" (prisões – campos de concentração onde as pessoas eram submetidas a trabalhos forçados). Poucos sobreviveram devido às péssimas condições: exigiam-se quotas extenuantes no trabalho, má alimentação e frio intenso quando eram destinados aos "gulags" de regiões frias como as Ilhas Solovki, Sibéria etc.
A ordem da NKVS nº 00447, de 30/07/1937 dispunha sobre as repressões e, a partir de agosto de 1937 a novembro de 1938 foram aprisionados de 800 mil a 820 mil pessoas, das quais, no mínimo 350 mil a 445 mil foram exterminadas. O restante foi enviado aos "gulags".
As ordens iniciais determinavam quotas - aprisionar 233.700 pessoas, 59.200 delas fuzilar -- quotas freqüentemente superadas pelo trio local para mostrar dedicação e conseguir destaque.
As operações executadas sob essa ordem receberam a denominação "Grande Terror".
Essa ordem somente veio a público em 1992. Os documentos encontrados indicam que o Partido Comunista da União Soviética e seus dirigentes desempenharam participação ativa na organização das perseguições e execuções em massa.
Em Bykovnia foram enterradas 120 a 130 mil pessoas. Essa tragédia equipara-se às tragédias de Auschwitz, Bukhenwald, Dachau, Babyn Yar, Katyn ...
Em 1944 - 1945 também foram enterrados ali, no fundo da mata, os militares da União Soviética aprisionados pelos alemães durante a II Grande Guerra, e pessoas da comunidade, que o exército alemão enviava à força para trabalhos forçados na Alemanha e que retornavam à Pátria, do cativeiro. Foram encontrados cadáveres de fuzilados, em grande quantidade.
Ainda durante o governo da União Soviética, com o intuito de atribuir aos alemães todas estas atrocidades, realizaram-se quatro comissões para averiguar os fatos. As três primeiras acusaram o fascismo alemão. Somente a quarta, sob pressão da população atribuiu a ação criminal ao NKVS.
Em 30/04/1994 ocorreu a abertura do complexo à memória das vítimas do regime comunista.
Em 21/05/2006 o ex-presidente Victor Yushenko assinou o decreto que dá à reserva de memória histórica "Túmulos de Bykivnia" a condição de Nacional.
Em 28/10/2006, com a bênção do Patriarca Filaret, o Arcebispo Dymytryi, de Pereiaslav, encabeçou a missa de réquiem dedicada ao traslado de 817 vítimas do regime comunista na floresta Bykivnia.
A floresta Bykivnia é o último lugar de repouso para mais de 100 mil pessoas inocentes que morreram fuziladas, após serem detidas pelo NKVS, os serviços sociais soviéticos.
Pesquisa: Internet
Oksana Kowaltschuk
Fotoformatação: A.Oliynik
Fotos de Viktor Kruk



A SEGUIR ALGUMAS IMAGENS RESULTANTES DO RASTRO DEIXADO PELO COMUNISMO RUSSO




























sexta-feira, 18 de março de 2011

O COMUNISMO, O NAZISMO E O GENOCÍDIO NA UCRÂNIA

O documentário "The Soviet Story" com legendas em português, realizado pelo cineasta e cientista político da Letônia, Edwin Snore, revela como a União Soviética ajudou a Alemanha Nazista a se preparar para a Segunda Guerra Mundial. Snore passou 10 anos coletando informações e dois anos filmando em vários países. Apresenta ainda os crimes soviéticos contra a humanidade e contra a Ucrânia onde assassinou sete milhões de seres humanos, através da fome e das deportações em massa para os campos de concentração. Sublinha as semelhanças entre a Alemanha nazista e Rússia soviética e a mútua colaboração entre os dois sistemas totalitários e socialistas. Aponta a indolência e apatia da Europa atual, carente de ânimo para condenar os crimes comunistas contra a humanidade, em parte, por se deixar levar pela pressão política feita pela atual Rússia.
NOTÍCIAS da Ucrânia inicia aqui a série de apresentações deste documentário que mostra como funciona a "ternura" comunista.
O documentário está dividido em 13 (treze) partes. Assista-as, não apenas como registro histórico, mas com visão de um regime que está sendo reimplantado na Ucrânia e implantado no Brasil e você não está enxergando. O "paraíso" comunista se concretiza com nova roupagem, por assimilação na Ucrânia e por métodos gramscianos no Brasil, ambos tendo o mesmo efeito devastador e totalitário. Quem viver, verá.

 Parte 1

Parte 2

Parte 3

Parte 4

Parte 5

Parte 6

Parte 7

Parte 8

Parte 9

Parte 10

Parte 11

Parte 12

Parte 13 (Final)

sexta-feira, 11 de março de 2011

UCRÂNIA: Vitima do comunismo russo

Realismo comuno-socialista

Foto nº 1
1. Holodomor, ou a Grande Fome na Ucrânia de 1929 a 1932.
O povo ucraniano foi vítima de uma das maiores atrocidades do século XX: o extermínio pela fome, deportações em massa e terror, de 7 a 10 milhões de ucranianos, sem contar algumas outras nacionalidades soviéticas. Se os judeus tiveram o "holocausto" ou o Shoah, os ucranianos e outros demais povos sob o jugo soviético comandado por Jósef Stálin (Ioseb Besarionis Dze Jughashivili) tiveram o holodomor, ou a "morte pela fome", em língua ucraniana. Ao coletivizar a terra dos camponeses, Stalin deportou, pela força, milhões de cidadãos para as fazendas coletivas do Estado, ou os kholkozes. No entanto, devido aos maus tratos e ao tratamento análogo de escravos com que eram tratados, os camponeses se rebelavam e fugiam das fazendas, além de esconder os grãos dos alimentos, para sua própria sobrevivência, uma vez que o Estado confiscava a maior parte dos cereais. A mesma crise que matou milhões na Rússia, em 1921, ameaçava se repetir de novo, na coletivização. Todavia, Stalin não estava preocupado com isso. Como os agricultores resistiam ao confisco de seus bens e propriedades rurais, ele simplesmente usou a "arma da fome" para subjugar o campesinato soviético. Grandes extensões da Ucrânia tiveram seus grãos confiscados, e como uma massa de esfomeados fugia para as cidades, o regime comunista fechou as fronteiras das cidades, deixando a população morrer à míngua de fome. A polícia política soviética, para controlar os passos dos fugitivos da fome no meio rural, impôs um sistema de passaportes, para fiscalizar o direito de ir e vir dos cidadãos. Quem fosse pego sem passaportes, poderia ser deportado para seu local de origem, para os campos de concentração ou então seria fuzilado. Muitas crianças esfomeadas fugiam pra Moscou e eram mandadas de volta para a Ucrânia, para morrerem lá. Stalin ainda decretou uma lei perversa, chamada pelo povo como "lei das espigas": bastava o roubo de alguns grãos de alimentos, para imputar anos de cadeia ao infrator. Ou quando não iam para seu país de origem, alguns camponeses eram mandados para o "gulag" ou como "colono especial" na Sibéria, em condições de vida desumanas. Eram usados como mão de obra da GPU, a então polícia política da época, em regime de trabalhos forçados, onde uma boa parte morria de maus tratos e exaustão. A foto nº 1 acima é uma pilha de cadáveres abandonados num cemitério, causada pela fome.

1.1 Cenas do Holodomor.


 Foto 2
Corpos abandonados em um cemitério ucraniano.


 Foto 3
Os transeuntes indiferentes, enquanto outros agonizam pela fome. . .

 Foto 4
Nem os animais são poupados da penúria. . .

 Foto 5

 Foto 6
A morte como espetáculo cotidiano. . .


 Foto 7

 Foto 8


 Foto 9
Crianças ucranianas famintas. . .

 Foto 10

 Foto 11


 Foto 12

 Foto 13
Cadáver de uma camponesa ucraniana.


Matéria publicada originalmente no blog "Conde Loppeux de la Villanueva" a quem são devidos os créditos.

EIS O QUE OS COMUNISTAS SABEM PRODUZIR COM PERFEIÇÃO!

O CAOS HUMANO
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Lembrando o Holodomor

Autor - ex-Presidente da Ucrânia Viktor Yushchenko

Setenta e cinco anos atrás, o povo ucraniano foi vítima de um crime bárbaro. No Ocidente, foi denominado de "A Grande Fome". Em nosso país, a Ucrânia, é conhecido como "Holodomor". Trata-se de uma campanha organizada de fome coletiva que, nos anos de 1932 e 1933, exterminou, de acordo com diversas estimativas, entre sete e dez milhões de cidadãos, incluindo um terço de todas as crianças da Ucrânia. Através de uma forma hedionda de mitigar a dimensão do acontecimento, o Estado soviético denominou o fato como uma mera "frustração de safra". Dirigentes soviéticos pretendiam evitar responsabilidade e esconder a real intencionalidade, as causas e as conseqüências dessa tragédia humana. Apenas isso seria o bastante para fazer uma pausa e honrar a memória das vítimas.
Durante as longas décadas de Estado soviético, para os ucranianos era perigoso discutir seu maior trauma nacional. Qualquer comentário sobre "Holodomor" era considerado um crime contra o Estado. As memórias das testemunhas e artigos de historiadores como Robert Conquest e James Mayes (já falecido), foram proibidos, pois eram considerados propaganda anti-soviética. No entanto, cada família ucraniana, através de suas memórias, sabia sobre a magnitude do acontecido. Os ucranianos sabiam que tudo isso foi perpetrado intencionalmente para punir a Ucrânia e destruir a sua base nacional. Em memória das vítimas e para restabelecer a verdade histórica, a Ucrânia independente luta atualmente por uma melhor compreensão e reconhecimento do "Holodomor", tanto dentro do país como em todo o mundo.
As nossas ações não são ditadas por um desejo de vingança ou tendenciosas opiniões políticas. Sabemos que os próprios russos foram as principais vítimas de Stalin. A última coisa que passa por nossa cabeça é atribuir culpa aos atuais herdeiros do Estado Soviético. Nosso único desejo é, apenas, conseguir compreender o que realmente aconteceu. É por isso que o parlamento ucraniano aprovou no ano passado uma lei sobre o reconhecimento do "Holodomor" como ato de genocídio. Por isso, peço a nossos amigos e aliados para apoiar este ponto de vista. Quando o mundo é indiferente por causa da amnésia histórica, ou da falsificação da história, está condenado a repetir seus piores erros.
"Genocídio" é um termo muito pesado e alguns ainda contestam sua aplicabilidade para o que aconteceu na Ucrânia. Por isso, deve-se voltar à definição legal desse crime, consagrada na Convenção das Nações Unidas sobre Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, datada de 1948. Assim, considera-se como genocídio "quaisquer atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, a nível nacional, étnico, racial ou religioso, qualquer desses grupos", incluindo "deliberadamente infligir sobre o grupo condições de vida calculadas para trazer a sua destruição física, total ou parcial". "Holodomor" é inteiramente coerente com esta definição. É digno de nota que isso se enquadra ao pensamento de Raphael Lemkin, um advogado cientista, que detém a autoria da Convenção sobre Genocídio.
Hoje em dia, existem muitos materiais históricos especificando os pormenores da política de coletivização forçada de Stalin e do terror de fome dirigido contra a Ucrânia. Outras regiões da União Soviética também foram fortemente afetadas. Mas a liderança soviética tinha uma finalidade velada para a perseguição e tortura de fome contra o campesinato ucraniano. Isto foi parte de uma campanha para reprimir a identidade nacional ucraniana e o desejo de soberania nacional. Como comentou alguns anos antes o próprio Stalin "não se tem um movimento nacional poderoso sem o exército camponês <...> essencialmente, a questão nacional é a questão camponesa". Na tentativa de reverter a política de "ucrainização", o que contribuiu para a limitada autonomia cultural e política, ao longo da década de 1920, Stalin decidiu derrubar o campesinato, que compunha 80% da nação. A resolução para a questão nacional da Ucrânia foi realizar um massacre por meio da fome.
Os métodos de Stalin incluíam uma determinação astronômica de recolhimento de produção agrícola para os estoques do Estado, que eram impossíveis de cumprir e que não deixava nada para alimentar a população local. Quando o plano não se concretizava, tropas eram enviadas à região. Até ao final de 1932, aldeias e regiões inteiras foram isoladas, transformadas em guetos de fome, cujos nomes foram registrados nas listas negras do Regime. Todo esse tempo, a União Soviética continuou a exportação de cereais para o Ocidente e até mesmo a produzir álcool. No início 1933, a liderança soviética decidiu reforçar radicalmente o bloqueio das aldeias ucranianas. Como resultado, todo o território da Ucrânia foi cercado por tropas e todo o país se transformou em um enorme campo da morte.
Um claro direcionamento antinacional de Stalin estava em curso de ação e percebia-se nitidamente uma campanha contra as instituições e os indivíduos que tinham contribuído para o desenvolvimento da vida cultural e social do povo ucraniano. Entre as vítimas destacamos: a Academia de Ciências da Ucrânia, a Editora da Enciclopédia Ucraniano-Soviética, a Igreja Ortodoxa Ucraniana e, no fim, o próprio Partido Comunista da Ucrânia. Foi uma campanha sistemática contra o povo ucraniano, a sua história, cultura, linguagem e estilo de vida.
O "Holodomor" foi um ato de genocídio, que foi concebido para esmagar o povo ucraniano. O fato de que a tentativa fracassou e agora a Ucrânia vive como uma nação independente e soberana, não dá o direito de diminuir a gravidade do crime. Também não nos isenta da responsabilidade moral de reconhecer o que ocorreu. No septuagésimo quinto aniversário, devemos, perante as vítimas do "Holodomor" e de outros genocídios ser justos em relação ao nosso passado.

WSJ, 26.11.2007
Fonte: Consulado da Ucrânia em Curitiba consulucr@onda.com.br
O genocídio do povo ucraniano por Stalin e o comunismo russo continua em 1937 e depois em 1947.

 Foto 14

Vinitsa, Ucrânia, 1937-1939: cadáveres de prisioneiros políticos ucranianos, assassinados pela NKVD[1].


[1] A NKVD mais tarde foi transformada em KGB.

terça-feira, 8 de março de 2011

TERROR E FOME NA UCRÂNIA

por Thomas E. Woods, Jr.

Resumo: O genocídio cometido pelo regime comunista soviético na Ucrânia foi uma das maiores tragédias do século XX, e permanece ignorado.

© 2004 MidiaSemMascara.org

Como acontece com todos os regimes totalitários, também o da Rússia bolchevique via com apreensão qualquer expressão de sentimento nacionalista que surgisse em meio aos povos sob seu jugo. A propaganda bolchevique sobre os direitos das várias nacionalidades dentro da órbita da Rússia mascarava o medo do regime diante do poder do nacionalismo.

Em 1918, o líder russo Vladimir Ilich Lenin tentou impor um governo soviético ao povo da Ucrânia, país que havia declarado sua independência apenas um mês antes. Durante o breve período em que durou, este governo tentou acabar com as instituições educacionais e sociais da Ucrânia. Desta época, há até relatos sobre uma precursora da KGB, a Cheka (Comissão Extraordinária Para a Luta Contra-Revolucionária), cujos agentes matavam pessoas pelo crime de falarem ucraniano na rua.

No final daquele mesmo ano, os ucranianos acabaram re-estabelecendo a república. A vitória, no entanto, durou pouco. É certo que, de uma forma ou de outra, Lenin acabaria por querer incorporar a Ucrânia à União Soviética. Garantir o controle daquele território, no entanto, era particularmente importante para Lenin devido aos seus grandes recursos naturais. A Ucrânia possui um dos solos mais férteis da Europa, o que lhe valeu o apelido de "cesta de pães da Europa".

No início de 1919, um novo governo soviético já tinha sido estabelecido na Ucrânia, mas novamente falhou. Esses acontecimentos coincidiram com a Guerra Civil Russa e o apoio de facções rivais contribuiu para que a Ucrânia, pela segunda vez, recuperasse sua independência.

O regime de Lenin aprendeu uma valiosa lição com esses dois fracassos. Segundo Robert Conquest, "chegou-se à conclusão de que a nacionalidade e a língua ucranianas eram dois fatores de suma importância; e um regime que ignorasse isso ostensivamente estava fadado a ser visto pela população como uma mera imposição". Quando os soviéticos conquistaram o controle da Ucrânia pela terceira e derradeira vez em 1920, perceberam que, a menos que fizessem grandes concessões quanto à autonomia cultural ucraniana, seria impossível evitar as constantes insurreições. Durante uma década, então, os ucranianos - com sua cultura e sua língua - foram deixados em paz. Entre os comunistas russos, entretanto, sempre existiu aquela facção que via no nacionalismo ucraniano uma fonte intolerável de desunião dentro das fileiras soviéticas e que achava que, mais cedo ou mais tarde, a situação teria de ser enfrentada de algum modo.

Oito anos mais tarde, em 1928, quando Joseph Stalin já estava no poder, a União Soviética optou por uma política de "requisição de grãos" em grande escala (a expressão era uma maneira eufemística de dizer que se planejava tomar a produção dos camponeses à força). Devido à falta de informação e à sua característica ignorância com relação aos princípios que regem o funcionamento do mercado, as lideranças soviéticas estavam convencidas de que o país estava no meio de uma crise de grãos. Pode-se dizer, grosso modo, que as requisições funcionaram, na medida em que garantiram ao governo os grãos supostamente necessários. Mas, elas abalaram definitivamente a confiança dos camponeses no regime. A partir de então, o fantasma da possível volta das requisições – uma prática que havia sido encarada como uma versão aberrante dos confiscos de grãos empreendidos por Lenin na época da Guerra Civil Russa – assombraria para sempre os camponeses. Naturalmente, eles se sentiam agora muito menos incentivados a produzir, pois sabiam muito bem que os frutos de seu árduo trabalho podiam ser facilmente confiscados por um regime sem lei, o mesmo que confiscara, em 1928, os próprios grãos cuja liberdade de produção e venda havia prometido aos camponeses.

Uma vez que a abolição da propriedade privada constituía um aspecto importante do programa marxista, era apenas uma questão de tempo até que o regime decidisse embarcar em uma jornada de coletivização das fazendas. Os camponeses seriam então amontoados em enormes fazendas estatais, as quais não apenas satisfariam as exigências da ideologia marxista, como também resolveriam o problema prático do abastecimento de grãos nas cidades, onde o proletariado soviético trabalhava arduamente na realização de uma rápida industrialização. Fazendas estatais significavam grãos estatais.

Alguns especialistas tentaram avisar Stalin de que suas metas, por demais ambiciosas tanto para a indústria como para a agricultura, eram ridiculamente incompatíveis com a realidade. Um de seus economistas então simplesmente explicou: "Nossa tarefa não é estudar economia, mas mudar a economia. Não estamos submetidos a nenhuma lei. Não há fortalezas contra as quais os bolcheviques não possam investir".

Juntamente com a política de coletivização, Stalin conduziu uma campanha brutal contra os latifundiários, ou kulaks, cuja resitência à coletivização já era esperada. A idéia de que apenas aqueles indivíduos definidos como kulaks se oporiam à coletivização era uma fantasia de Stalin; toda a população do campo estava unida nessa oposição. Até o Pravda divulgou um incidente envolvendo mulheres ucranianas que tentaram bloquear a passagem de tratores que chegavam ao campo para serem usados em fazendas coletivizadas. As mulheres gritavam: "O governo soviético está trazendo de volta a escravidão!"

Stalin constantemente falava de sua política de "extinção dos kulaks como classe social" Eles eram os inimigos públicos do campo. De fato, com o passar do tempo, a definição de kulak foi-se tornando tão elástica que o conceito – assim como as terríveis punições impostas àqueles que nele se encaixavam – podia ser aplicado a praticamente qualquer camponês.

Segundo um livro oficial de história do Partido Comunista, "os camponeses expulsavam os kulaks de sua terra, 'deskulakizavam-nos', levavam seus animais de criação e os encaminhavam às autoridades soviéticas para que fossem presos e deportados". Como descrição do terror empreendido contra os kulaks, esse relato não serve nem como piada de mau gosto, uma vez que era o governo que dirigia as perseguições. Ao fim, de acordo com uma testemunha ocular, para que um homem estivesse condenado, bastava que "tivesse contratado pessoas para trabalhar para ele como assalariadas ou [que tivesse] sido dono de três ou quatro vacas".

Em 1929, cerca de 20 milhões de propriedades familiares podiam ser encontradas nas áreas rurais da Rússia. Cinco anos depois, todas elas estavam concentradas em 240 mil fazendas coletivas. Ao longo da história da União Soviética, contudo, não são poucos os casos em que se permitiu a certas pessoas possuirem alguns acres de terra para uso particular. E quando Mikhail Gorbachev subiu ao poder em 1985, as propriedades particulares, que totalizavam 2% das terras soviéticas, eram responsáveis por 30% da produção de grãos no país – uma verdadeira humilhação para aqueles que vociferaram que a agricultura socialista tornar-se-ia mais eficiente que a capitalista, ou que poderiam mudar a natureza humana ou reescrever as leis da economia.

Na mesma época em que deu início à coletivização forçada, Stalin também ressuscitou a campanha anti-nacionalista contra a cultura ucraniana, suspensa desde 1920. Foi na Ucrânia que a política de coletivização de Stalin encontrou a mais forte resistência, muito embora o processo, mesmo lá, já estivesse praticamente concluído em 1932. Não obstante, Stalin considerava a persistência do sentimento nacionalista ucraniano uma ameaça permanente ao regime soviético, o que o levou à decisão de resolver, de uma vez por todas, o que via como o problema da lealdade na Ucrânia.

O primeiro estágio desta política de Stalin na Ucrânia dirigiu-se aos intelectuais e às pessoas ligadas à cultura, milhares das quais foram presas e receberam simulacros de julgamento. Cumprido o objetivo de privar o povo ucraniano daqueles que seriam os líderes naturais de futuros movimentos de resistência, Stalin se voltou para o próprio campesinato, que era o verdadeiro portador das tradições ucranianas.

Apesar do adiantado estágio em que se encontrava o processo de coletivização na Ucrânia, Stalin declarou que a guerra contra os perversos kulaks ainda não estava acabada – eles tinham sido "derrotados, mas não exterminados". Para supostamente combater os kulaks, Stalin agora começaria uma guerra contra os poucos fazendeiros independentes que ainda existiam e dentro das próprias fazendas coletivas. A esta altura, qualquer indivíduo que, por qualquer motivo, pudesse ser classificado como kulak já tinha há muito sido afugentado, assassinado ou enviado a campos de concentração. A estratégia da campanha seria, portanto, aterrorizar os camponeses comuns. Eles deveriam ser destruídos, física e espiritualmente, e sua identidade como povo lhes seria sugada à força.

Stalin começou a estabelecer metas de produção de grãos impossíveis de serem cumpridas sem que os próprios camponeses morressem de fome. O não-cumprimento dessas metas era considerado sabotagem deliberada e, por fim, Stalin acabou por autorizar o confisco da produção para que se cumprissem as metas. Um historiador conta a história de uma mulher que foi presa com um de seus filhos por ter tentado colher um pouco de seu próprio trigo. Após ter conseguido fugir da prisão, a mulher juntou umas coisas e fugiu para a floresta, onde viveu com seu filho por um mês e meio. As pessoas eram condenadas a dez anos de prisão por colherem batatas ou até por arrancarem espigas de milho nos pequenos sítios que o governo lhes permitia possuir.

Os militantes comunistas - alegando que os sabotadores estavam por toda parte, negando-se a fornecer alimentos às cidades e desafiando as ordens de Stalin - faziam buscas em propriedades privadas. Os mais gentis deixavam uma quantidade módica de alimento para as famílias e os mais cruéis levavam tudo.

O resultado era bastante previsível: as pessoas começaram a morrer de fome, em contingentes cada vez maiores, ao ponto de que o camponês que não aparentasse estar morrendo de fome era considerado suspeito pelos soviéticos. Conta um historiador que "um militante, ao fazer uma busca na casa de um camponês cujo corpo não tinha ficado inchado, finalmente encontrou um saco que continha farinha misturada com cascas esfareladas e folhas, jogando-o então no açude do vilarejo".

Conquest cita o depoimento de um militante:

"Eu ouvia as crianças... engasgando, tossindo aos gritos. Era aterrorizante ver e ouvir tudo isso. Pior ainda era tomar parte nisso... Eu explicava a mim mesmo e me persuadia de que não devia me deixar enfraquecer e me entregar à compaixão... Estávamos cumprindo nosso dever revolucionário. Nós estávamos recolhendo grãos para a pátria socialista...
Nossa grande meta era o triunfo universal do Comunismo e, para atingir essa meta, tudo era permitido – mentir, enganar, roubar, matar milhares e até milhões de pessoas...
Era assim que eu raciocinava, eu e todos os meus colegas, mesmo depois... de descobrir o que realmente significava a 'coletivização total' – como eles 'kulakizavam' e 'deskulakizavam', como eles despiam impiedosamente os camponeses durante o inverno de 1932-33. Eu mesmo participei, rastreando o campo, procurando por grãos escondidos... Junto com os outros, eu esvaziei armazéns de camponeses idosos, tampando meus ouvidos ao choro das crianças e às lamentações das mães, pois eu estava convencido de que estava realizando a grande e inevitável transformação do campo; de que no futuro as pessoas que viviam ali estariam em melhores condições por causa disso...
Naquela terrível primavera de 1933, eu vi pessoas morrendo de fome. Eu vi mulheres e crianças de barriga inchada, ficando azuis, respirando ainda, mas com os olhos vagos, sem vida... Eu [não] perdi minha fé. Como sempre, eu acreditava porque queria acreditar."

Em 1933, Stalin emitiu uma nova ordem de busca, cuja execução começou em março daquele ano em uma Ucrânia devastada pela fome. Pouparei o leitor de descrições gráficas do que aconteceu então. Direi apenas que havia cadáveres por toda parte e o fedor da morte era tão intenso que deixava o ar pesado. Vários casos de loucura e até canibalismo foram documentados. Cada família de camponeses reagia de modo diferente à lenta morte por inanição:

"Dentro de uma choupana qualquer, a situação era de guerra. Todos se vigiavam atentamente e brigavam por migalhas de pão; a esposa havia-se tornado inimiga do marido e vice-versa; a mãe odiava os filhos. Em outra choupana, o amor era sagrado. Eu conheci uma mulher que tinha quatro filhos. Ela contava lendas e contos de fadas às crianças, para que elas esquecessem que estavam famintas. Mal conseguia mover sua língua, mas encontrava forças para tomar seus filhos nos braços, mesmo que mal conseguisse levantá-los quando não havia ninguém entre eles. O amor sobrevivia dentro dela. As pessoas então começaram a perceber que onde havia ódio os cadáveres se multiplicavam mais rapidamente. Mesmo assim, o amor não salvou ninguém da morte. Todo o vilarejo pereceu. Toda a vida se extinguiu."

O número de ucranianos mortos na fome de 1932-33 foi de aproximadamente 5 milhões. Mas, segundo Conquest, se forem computadas outras catástrofes ocorridas entre 1930 e 1937, incluindo-se as inumeráveis deportações de supostos "kulaks", atinge-se a estarrecedora cifra de 14,5 milhões. Mesmo assim, seria um pequeno milagre se 1% dos alunos que cursam a minha disciplina a cada ano tivesse sequer ouvido falar desses acontecimentos.

Já me referi várias vezes aqui ao historiador Robert Conquest, um excelente estudioso da história da União Soviética, e gostaria de pedir encarecidamente a todos que se interessem por esses acontecimentos que leiam seu extraordinário livro The Harvest of Sorrow (A Colheita Maldita). Parece um romance, mas a história que ele conta é bem real.

Depois de todas as acusações contra "A Paixão de Cristo", Peggy Noonan perguntou a Mel Gibson, sem cerimônia: "O Holocausto aconteceu, certo?"
Gibson, estarrecido, surpreso com o fato de que alguém precisasse recorrer a ele para confirmar a veracidade de fatos históricos, respondeu que sim, claro que aconteceu. Acrescentou ainda que o século XX está repleto de atrocidades e nenhuma delas deveria ser esquecida. Mencionou então a tragédia na Ucrânia, onde o regime de Joseph Stalin matou de fome 7 milhões de pessoas, deliberadamente.

Obviamente, a resposta serviu apenas para reafirmar a perversidade de Gibson na cabeça daqueles que já o desprezavam. Como, por exemplo, Abe Foxman, presidente da Anti-Defamation League (Liga Anti-Difamação), que disse ter ficado chocado e desgostoso com as observações do diretor. Segundo Foxman, "ele não entende nem de longe a diferença entre se morrer de fome e pessoas sendo cremadas pelo simples fato de serem o que são". Então foi isso que aconteceu na Ucrânia – as pessoas simplesmente "morreram de fome".

(Publicado originalmente por lewrockwell.com)
Tradução: Evandro Ferreira - evandroferreira.outonos.com.

Este artigo foi publicado pela primeira vez em 11 de maio de 2004 (O Cossaco).