sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Governo interino da Ucrânia acusa Rússia de “invasão armada” na Crimeia



PÚBLICO 28/02/2014 - 08h44min (atualizado às 12h37min) 


Ucrânia pede extradição de Yanukovych e emite mandados de captura para dez ex-dirigentes políticos.


O ministro interino do Interior da Ucrânia acusou as forças russas de “invasão armada” depois da ocupação de dois aeroportos na região da Criméia.

Membros de uma milícia pró-russa ocuparam esta sexta-feira de manhã parte do principal aeroporto da província. As autoridades ucranianas dizem ainda que forças militares russas bloquearam o aeroporto militar de Sebastopol, a cidade portuária onde a Rússia tem a sua Frota do Mar Negro estacionada. Os russos negam qualquer envolvimento: "Nenhuma unidade da Frota do Mar Negro avançou para o aeroporto, muito menos participa em qualquer bloqueio", diz um porta-voz.

“Considero o que se está a passar uma invasão armada e uma ocupação que viola todos os acordos e as normas internacionais”, escreveu o ministro Arsen Avakov na sua página de Facebook.

Ao início da tarde, as autoridades ucranianas voltaram a controlar os aeroportos, afirmou o diretor do Conselho Nacional de Segurança, Andrei Parubi. "Houve uma tentativa de tomada dos aeroportos de Simferopol e de Sebastopol, mas voltaram agora ao controle pelas forças de segurança ucranianas", revelou Parubi.

Entretanto, o chefe das Forças Armadas, Yuri Ilin, foi demitido pelo Presidente interino, Oleksander Turchinov, segundo a BBC. Ilin foi nomeado ainda por Viktor Yanukovych durante os confrontos de há duas semanas. Na altura especulava-se que o exército poderia estar perto de ser chamado a intervir.

Vários dos homens que entraram nos aeroportos acabaram por sair, embora alguns se tenham mantido, segundo várias agências. Há também relatos da aproximação de helicópteros militares russos.

“Estou com a Milícia do Povo da Criméia”, disse à Reuters um homem que se identificou como Vladimir. “Estamos a trabalhar para manter a ordem no aeroporto. Vamos receber os aviões com um sorriso.”

Segundo a AFP, para além destes milicianos, vestidos com roupas civis, há homens, com uniformes e armados com Kalashnikovs, que patrulham o exterior do aeroporto de Simferopol. Estes não permitem que os jornalistas se aproximem, ao contrário dos milicianos. “Estamos aqui para manter a ordem pública e não bloqueamos nada. Mas se os bandidos nacionalistas vierem vamos combatê-los.”


Apelo aos EUA e ao Reino Unido

O Parlamento ucraniano votou entretanto uma resolução, que vai fazer chegar ao Conselho de Segurança da ONU, onde apela aos Estados Unidos e ao Reino Unido para garantirem a sua soberania – estes países, tal como a Rússia, assinaram o Memorando de Budapeste, em 1994, acordo que dava à Ucrânia a garantia de independência em troca da sua renúncia a armas nucleares.

O texto aprovado pelos deputados pede a norte-americanos e britânicos que “confirmem os seus compromissos” com a Ucrânia e lancem “consultas imediatas para fazer baixar a tensão no país”.

A Comissão Européia fez apelos para que seja encontrada uma "solução política" e que as partes envolvidas tenham um comportamento "contido e moderado". "A situação na Criméia requer uma solução política que só pode ser alcançada através da via do diálogo entre as diferentes partes envolvidas", afirmou um porta-voz da comissão.

A Criméia é a única região da Ucrânia onde a maioria da população é de origem russa e as tensões estão em crescendo desde sábado, quando o Presidente Viktor Yanukovych desapareceu e a oposição tomou o poder. Na quinta-feira, um comando pró-russo ocupou já a sede do governo e do parlamento da região autônoma, enquanto Moscou colocava em alerta de combate os seus aviões junto à fronteira ocidental.

Os deputados regionais aprovaram a marcação de um referendo sobre a autonomia da província, justificando a medida como as ameaças à paz na Criméia, fruto “da tomada inconstitucional do poder na Ucrânia por nacionalistas radicais, com o apoio de grupos criminosos armados”.


Extradição para Yanukovych

Num outro desafio aos novos líderes de Kiev, Yanukovych prepara-se para dar uma conferência de imprensa esta sexta-feira. Isso anunciou o próprio na quinta-feira, seis dias depois de ter desaparecido. “Ainda me considero o legítimo chefe de Estado ucraniano”, disse, em declarações à agência russa Itar-Tass, sem revelar o seu paradeiro mas explicando ter pedido “às autoridades russas” para garantirem à sua segurança “contra os extremistas”.

A justiça ucraniana vai pedir a extradição de Yanukovych, caso se confirme a sua presença na Rússia, anunciou esta sexta-feira o procurador-geral. Será, contudo, improvável que Moscou aceda ao pedido da Ucrânia, alertam alguns analistas. O procurador emitiu também dez mandados de captura em nome de várias figuras da anterior administração, segundo a Reuters.

A Áustria e a Suíça congelaram as contas bancárias de vários cidadãos ucranianos suspeitos de abusos de direitos humanos, na sua maioria antigos governantes do país. Um deles será o filho de Yanukovych, Oleksander, presidente da sociedade Mako Trading, com sede em Genebra, e que tem uma fortuna calculada em 500 milhões de dólares, segundo a AFP.

As autoridades policiais suíças lançaram também um inquérito criminal aos negócios de Yanukovych e do seu filho, sob suspeita da lavagem de dinheiro. O Ministério Público afirma que já foram iniciadas buscas a alguns escritórios em Genebra.


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Milícia pró-russa toma edifícios governamentais na Crimeia

Líderes ucranianos dizem a Moscou que “qualquer movimento de tropas será considerado uma agressão militar”. Crimeia aprovou realização de referendo sobre estatuto de autonomia.
As forças de segurança estão em alerta na Crimeia BAZ RATNER/REUTERS
O presidente interino da Ucrânia avisou esta quinta-feira a frota russa contra qualquer “agressão militar”. Oleksandr Turchinov falava pouco depois de um grupo de homens armados pró-russos ter tomado vários edifícios governamentais na Crimeia, ao mesmo tempo que a agência de notícias russa Interfax noticiava que os aviões russos ao longo da fronteira ocidental tinham sido colocados em alerta de combate.
“Dirijo-me aos dirigentes militares da frota do Mar Negro: todos os militares devem permanecer no território previsto pelos acordos. Qualquer movimento de tropas será considerado uma agressão militar”, disse Turchinov numa intervenção no Parlamento, em Kiev. O enviado diplomático da Rússia foi convocado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano, que repetiu os avisos de Turchinov.
Moscou assegurou que "a frota russa no Mar Negro aplica estritamente todos os acordos em questão". O Ministério dos Negócios Estrangeiros acrescentou que "o envio de certos veículos blindados da frota do Mar do Negro foi feita em conformidade com os acordos e não necessita de qualquer aprovação". Durante as manifestações desta semana na Crimeia, foram deslocados dois veículos blindados russos para dois locais de Sebastopol.
É precisamente na cidade portuária de Sebastopol, na Crimeia, única região da Ucrânia onde a maioria da população tem origem russa, que Moscou tem estacionada a sua frota do Mar Negro. Na quarta-feira, a Rússia já anunciara o início de um grande exercício militar junto à fronteira. “Patrulhas aéreas constantes estão a ser realizadas pelos aviões de combate nas regiões de fronteira”, escreve agora a Interfax, citando o Ministério da Defesa russo. “De momento, receberam ordens para estar em alerta máximo.”
O parlamento regional da Crimeia aprovou, ao início da tarde, a marcação de um referendo sobre a autonomia da província, avançam algumas agências. Foi lançado um comunicado de imprensa que justifica a decisão com as ameaças à paz na Crimeia, que resultam "da tomada inconstitucional do poder na Ucrânia por nacionalistas radicais, com o apoio de grupos criminosos armados".
"Estamos confiantes de que apenas a realização de um referendo sobre o estatuto de autonomia irá ajudar os habitantes da Crimeia a determinar o futuro da região sem pressões externas", afirma o comunicado, citado pela agência Itar-Tass.
A consulta foi marcada para 25 de Maio, o mesmo dia em que se vão realizar as eleições presidenciais antecipadas.
Desde sábado, dia em que o Presidente Viktor Yanukovych desapareceu e a oposição ucraniana tomou o poder , após três meses de protestos, que grupos que militam pelo retorno da Crimeia à Rússia terão começado a formar uma milícia para se defender das novas autoridades.
Quarta-feira, manifestantes anti-russos invadiram o parlamento regional depois de se ter espalhado o boato de que os deputados iam decidir declarar que a Crimeia se separaria do resto da Ucrânia. Seguiu-se uma batalha campal que envolveu milhares de pessoas de um de outro lado nas ruas do centro de Simferopol, a capital da região.
Esta manhã, dezenas de homens armados controlavam não só a sede do parlamento como a do governo regional da península russófona. Entraram durante a madrugada, içaram bandeiras russas e um cartaz onde se lê “Crimeia é Rússia”.
O primeiro-ministro regional, Anatoli Mohiliov, disse à AFP que os homens estão equipados com “armas modernas” e que impediram os funcionários de entrar nos edifícios. Mohiliov já falou ao telefone com o grupo, mas não lhe foram transmitidas quaisquer reivindicações.
O ministro interino do Interior, Arsen Avakov, anunciou ter posto a polícia em alerta para evitar “um banho de sangue entre a população civil”. “Os provocadores estão em marcha. É tempo para responder com cabeça fria”, escreveu Avakov na sua página de Facebook. Há forças de segurança em redor dos edifícios tomados.
Diplomacias ocidentais avisam Rússia
A ocupação dos edifícios do governo da Crimeia pode desencadear um conflito regional, avisa o ministro dos Negócios Estrangeiros da Polônia. “Isto é um desenvolvimento drástico e aviso os que o fizeram e os que o permitiram, é assim que começam os conflitos regionais. Este é um jogo muito perigoso”, disse Radoslaw Sikorski numa conferência de imprensa.
Londres considera que as movimentações militares russas são prejudiciais "num momento em que todas as partes, sejam nacionais ou internacionais, deveriam trabalhar para desarmar as tensões". O Ministério dos Negócios Estrangeiros britânico acrescentou que "a instabilidade na Ucrânia não é do interesse de ninguém".
A ministra da Defesa, Ursula von der Leyen, também manifestou a sua preocupação. “O mais importante é evitar a divisão da Ucrânia”, disse, à chegada a uma reunião da NATO em Bruxelas onde se vai debater precisamente a situação ucraniana.
Em antecipação à reunião da aliança, o secretário-geral da NATO, Anders Fogh Rasmussen, apelou à Rússia "para não tomar qualquer ação que possa fazer escalar a tensão ou criar desentendimentos". "Estou preocupado com os desenvolvimentos na Crimeia", afirmou Rasmussen através do Twitter.

FMI vai intervir na Ucrânia, novo governo tenta evitar a bancarrota

Mais de 50 mil milhões de euros terão saído dos cofres do país para paraísos fiscais, segundo o novo primeiro-ministro, cujo gabinete foi aprovado esta quinta-feira.
A Ucrânia precisa de um “governo de kamikazes”, disse Yatseniuk SERGEI SUPINSKY/AFP
O Fundo Monetário Internacional confirmou esta quinta-feira que recebeu um pedido de assistência do governo da Ucrânia ao qual está “pronto a responder”. A diretora do fundo, Christine Lagarde, revelou, citada pela AFP, que será enviada uma equipa ao país “nos próximos dias”.
O novo primeiro-ministro, Arseni Yatseniuk, revelou haver um buraco nas contas públicas superior a 50 mil milhões de euros, responsabilizando o Presidente deposto Viktor Yanukovych. Nos últimos três anos “a soma de 70 mil milhões de dólares (51 mil milhões de euros) saiu do sistema financeiro da Ucrânia em direção a contas em paraísos fiscais”, afirmou perante o Parlamento.
O Parlamento aprovou esta quinta-feira o novo governo interino da Ucrânia por larga maioria. O novo primeiro-ministro optou por um discurso realista que sublinha as dificuldades que o país terá pela frente.
O Presidente interino, Oleksander Turchinov, foi o primeiro a prever um futuro sombrio: “Este é um governo condenado a conseguir trabalhar por apenas três ou quatro meses porque terá de tomar decisões impopulares.” Seguiu-se Yatseniuk, que se referiu à necessidade de um “governo de kamikazes”, expressão que já tinha utilizado na véspera.
O diagnóstico foi posto a nu por Yatseniuk, que, aos 39 anos, já passou pelas pastas da Economia e dos Negócios Estrangeiros e foi governador do Banco Nacional da Ucrânia. “As contas públicas estão a zero (…) A dívida pública é de 75 mil milhões de dólares neste momento (…) O desemprego está num ritmo galopante, assim como a fuga de investimentos.”
As medidas “impopulares” vão passar pela “redução dos programas sociais e das subvenções” e pela “redução das despesas orçamentais”. Próximo poderá estar um empréstimo dos EUA no valor de mil milhões de dólares, segundo revelou o secretário de Estado, John Kerry, que acrescentou que a Europa está a equacionar um pacote no valor de 1,5 mil milhões.
A Rússia mantém em suspenso um acordo assinado com a anterior administração, em que estava prevista a concessão de um empréstimo superior a 11 mil milhões de euros.
Arseni Yatseniuk não deixou de referir a ameaça separatista na região autônoma da Crimeia, onde no mesmo dia um comando pró-russo tomou as sedes do parlamento e governo regionais.
“A integridade territorial está ameaçada, assistimos a manifestações de separatismo na Crimeia”, afirmou. “Disse aos russos para não nos enfrentarmos, nós somos amigos e parceiros.” O tom conciliador de Yatseniuk veio depois da notícia de que Moscou tinha iniciado exercícios militares perto da fronteira com a Ucrânia e que as suas forças armadas foram postas em alerta máximo.
Se, por um lado, os novos governantes tentam apaziguar as relações com a Rússia, por outro, fazem da aproximação à Europa uma das prioridades. “A Ucrânia vê o seu futuro na Europa, como membro da União Européia”, afirmou Yatseniuk, deixando antever que um dos próximos passos poderá ser a retoma das negociações para a assinatura do acordo com Bruxelas rejeitado em Novembro por Yanukovych.
À estratégia européia da Ucrânia não será alheia, por exemplo, a nomeação de um vice-primeiro-ministro para a Integração Européia. É a Boris Taraiuk, um diplomata que foi ministro dos Negócios Estrangeiros em quatro governos diferentes, que irá caber a missão.
O novo gabinete de ministros é descrito como “uma combinação de antigas caras manchadas por alegações de corrupção, novos heróis revolucionários e nomeados que podem fazer a diferença”, segundo a jornalista do Kyiv Post, Katia Gorchinskaia.
A Economist afirma mesmo que o governo será controlado por Yulia Tymoshenko, chamando a atenção para a grande quantidade de personalidades do seu partido. (fonte: publico.pt)

Yanukovych falou para dizer que ainda é o Presidente legítimo da Ucrânia

Presidente deposto pediu proteção às autoridades russas e apelou ao cumprimento do acordo assinado com a oposição.
O rato de esgoto reclamando o queijo
"Eu, Viktor Fedorovich Yanukovych, dirijo-me ao povo ucraniano. Ainda me considero o legítimo chefe de Estado ucraniano." Estas foram as primeiras declarações do ex-Presidente que se encontra em fuga desde domingo.
Foram precisos seis dias para que Yanukovych voltasse a falar publicamente. Em declarações à agência russa Itar-Tass, o Presidente deposto critica o "extremismo exagerado nas ruas" da Ucrânia e afirma ter recebido ameaças à sua integridade física.
"Tenho de pedir às autoridades russas para garantirem a minha segurança pessoal contra os extremistas", afirmou, sem contudo revelar o seu paradeiro.
A Rússia parece ter acedido ao pedido de Yanukovych, de acordo com uma fonte governamental. "Em relação ao apelo feito pelo Presidente Yanukovych pela garantia da sua segurança pessoal, informo que o pedido foi concedido para o território da Federação Russa", afirmou a fonte, citada pela agência Interfax.
Yanukovych garantiu ainda que vai “lutar pelo cumprimento dos importantes acordos de compromisso para retirar a Ucrânia da crise política”, numa referência ao acordo assinado com os líderes da oposição. Há precisamente uma semana, Yanukovych e a oposição chegaram a acordo para a marcação de eleições presidenciais antecipadas para este ano e para o retorno à Constituição de 2004.
No entanto, o documento previa que Yanukovych se mantivesse no cargo até às eleições. No mesmo dia, os manifestantes na Praça da Independência fizeram um ultimato para que Yanukovych resignasse.
No sábado, o ainda Presidente dirigiu-se para Donetsk, no Leste, onde terá tentado ir para o estrangeiro, tendo-lhe sido negada a saída do país. A última vez que foi visto foi na noite de domingo, na Crimeia. Desde então, muito se tem especulado acerca do seu paradeiro.
A instabilidade no país não foi esquecida por Yanukovych: “Torna-se evidente que o povo no sudeste da Ucrânia e na Crimeia não aceitam a anarquia e a ausência de lei no país, onde os ministros são eleitos por uma multidão numa praça.”
Afirmando que nunca deu indicações às Forças Armadas para intervir na crise do país, Yanukovych avisa que se alguém o fizer, “essas ordens serão consideradas ilegais e criminosas”.
Nos últimos dias, Yanukovych viu ser emitido um mandado de captura internacional contra si por “homicídio em massa” e ainda a possibilidade de ser julgado no Tribunal Penal Internacional. (Fonte: publico.pt)

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

DESAFIO MUNUMENTAL

Governo de “vontade popular” na Ucrânia tem tarefa monumental

Novo governo combina figuras próximas de Timochenko e líderes dos protestos. Os próximos tempos irão dizer se a democracia da Maidan funcionou.

Não deverá haver muitos governos na história da democracia cuja aprovação esteja dependente dos apupos ou palmas de uma multidão. Mas esse é pelo menos o método que os manifestantes da Praça da Independência quiseram utilizar para a formação do seu executivo, que terá tarefas gigantes pela frente. A primeira foi já nesta quarta-feira, perante a Maidan.
Como sempre, foram muitos os nomes referidos, uns mais plausíveis que outros, é certo. Em Kiev, o ambiente revolucionário que animou a Praça da Independência nos últimos meses parece estar para ficar. E mais: serão princípios revolucionários que vão guiar a agenda política dos governantes, a começar pela própria origem do gabinete de ministros.
A Praça Maidan preparava-se para uma longa jornada que começou ao início da noite com o anúncio de que o líder da oposição Arseni Yatseniuk (Partido Pátria) iria encabeçar o executivo. A partir daí, foram anunciados vários nomes, alguns mais consensuais do que outros. Certas nomeações foram vaiadas por grupos inteiros, como foi o caso do novo ministro do Interior, Arsen Avakov. De uma forma geral, o novo governo de unidade nacional combina várias personalidades próximas de Yulia Tymoshenko e figuras que se notabilizaram durante a contestação.
Yatseniuk tratava-se de uma escolha que muitos antecipavam, na medida em que alia a experiência de passagens por governos anteriores com a legitimidade de ter sido um dos rostos da contestação. Yatseniuk liderou o partido Pátria durante a prisão de Yulia Tymoshenko e acompanhou de perto os protestos dos últimos meses.
Poderá ser um bom sinal para os próximos tempos, uma vez que muito do futuro da Ucrânia vai depender das negociações internacionais para a obtenção de um resgate financeiro. Para além de uma experiência como ministro da Economia, Yatseniuk era visto como um dos líderes políticos da oposição mais fiáveis. Estando agora fora da corrida à presidência, a nomeação de Yatseniuk pode abrir caminho à possível candidatura de Tymoshenko.
Na Economia deverá ficar um acadêmico, Pavlo Sheremeta, fundador e reitor da Faculdade de Economia da Universidade Kiev Mohila. Uma das áreas mais sensíveis, as Finanças, ficará a cargo de Oleksander Schlapak, que foi chefe de gabinete do ex-Presidente Viktor Yushenko, que foi eleito na sequência da Revolução Laranja. Schlapak tem pela frente a difícil situação financeira da Ucrânia, cujas necessidades de financiamento para os próximos dois anos ascendem a 25 mil milhões de euros e que convive com uma desvalorização quase diária da moeda.
A escolha para os Negócios Estrangeiros recaiu em Andri Deshchitsia, que foi embaixador na Finlândia. A sua experiência diplomática no país nórdico poderá indicar que a gestão nas relações exteriores de Kiev irá privilegiar a integração europeia, sem contudo alienar totalmente Moscou, à semelhança do que é feito pela Finlândia.
Durante a tarde, o Conselho da Maidan – o órgão deliberativo informal formado durante os protestos – esteve a escolher alguns nomes para outros cargos. Andrei Parubi, ex-deputado do Pátria e um dos líderes da contestação, foi proposto para secretário do Conselho Nacional de Segurança e Defesa, tendo como vice o líder do Setor Direito, Dmitro Yarosh.
A confirmar-se a indicação de Iarosh, esta seria uma decisão potencialmente polémica. A entrega de uma posição de destaque ao líder de uma organização paramilitar de extrema-direita e que utilizou abertamente meios violentos durante os protestos pode despertar reservas, sobretudo nas regiões do Leste do país.
Outra nomeação emanada das ruas foi a de Dmitro Bulatov, que esteve à frente do movimento AutoMaidan, para a pasta da Juventude e Desporto. Bulatov foi raptado no final de Janeiro, tendo reaparecido uma semana depois com indícios de ferimentos graves. O ativista contou que foi levado por um grupo de homens para uma mata, onde foi espancado e crucificado.
Democracia direta
A rua soberana conseguiu, desde logo, adiar o anúncio da formação do governo. Inicialmente previsto para terça-feira, a contestação da Maidan em relação ao rumo que as negociações no Parlamento estavam a decorrer falou mais alto e a nomeação passou para quarta-feira. E foi a rua a indicar o método de escolha: a democracia direta, ao estilo da antiga cidade-Estado de Esparta, como descreveu ao PÚBLICO um dos líderes dos manifestantes, Andrei Parubi.
Não obstante as diferenças que possam existir entre as realidades de uma cidade da Antiguidade de 25 mil habitantes, totalmente vocacionada para a guerra, e um país moderno com uma população de 45 milhões, a justificação para o método referido por Parubi está em sintonia com o sentimento dominante nas ruas de Kiev. Em parte são os receios de que se repita o desenlace da Revolução Laranja de 2004 – que acabou por substituir uma classe política dominada pelos oligarcas por outra demasiado parecida – que dominam os anseios pela democracia direta. Mas há também a necessidade de reconhecer que a revolução da Maidan foi dirigida sobretudo pelas ruas, que não hesitaram em apupar e criticar os líderes políticos e que precipitaram a queda de Viktor Yanukovych.
Basta, contudo, olhar para os desafios que os novos governantes da Ucrânia terão pela frente para se concluir que juntar instabilidade governativa à situação crítica do país podia ser o pior a acontecer neste momento. É o próprio Parubi que nota ser possível que um governo seja aclamado pela Praça e, “horas depois” venham 30 mil pessoas derrubá-lo.
Crise econômica, integração europeia, relações com Moscou e manutenção da integridade territorial serão os principais temas que vão ocupar o novo governo. Ao mesmo tempo que têm de tentar redefinir a posição da Ucrânia no mundo, os novos governantes têm que assegurar que não perdem a legitimidade que, por agora, a rua parece confiar-lhes.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

QUEM DERRUBOU VIKTOR YANUKOVYCH?


Sem o apoio dos oligarcas, o Presidente recuou, irritou Moscou e no fim teve que fugir.

Três fatores levaram a queda de Yanukovych: primeiro, foi o desastrado massacre onde se contabilizou em torno de 88 mortos. Segundo, foi a evidência de que a rua não ia ceder. Terceiro, porque os oligarcas que patrocinam o Presidente e do qual ele depende deram sinais de que iriam deixar de apoiá-lo. 
Compreender os oligarcas é compreender o essencial da política ucraniana. A maioria dos atores políticos depende dos oligarcas, que construíram as suas enormes fortunas com a desagregação do aparelho produtivo soviético. Os oligarcas ucranianos, mesmo os que são culturalmente russófonos, não gostam da Rússia, por terem medo de serem engolidos pelos oligarcas russos. Gostam da União Europeia, mas preferiam não ter de respeitar as regras e o código de conduta comunitário. E têm medo de vir a ser atingidos pelas sanções.
Pressionado pela rua, sem o apoio dos oligarcas e sob indignação internacional pelo seu ato criminoso, Yanukovych só teve um caminho: fugir. Moscou, em retaliação, cortou os financiamentos que tinha acordado com o Presidente e dos quais a Ucrânia depende para não entrar em bancarrota. No imediato, alguém terá que pagar essa fatura. A crise ucraniana está longe do desfecho. Abriu-se uma porta à mudança, mas esta ainda está longe da consolidação.

Se a Ucrânia se partir, a Rússia ganhará sempre alguma coisa



Kiev é fundamental para o sucesso da união euroasiática de Putin. Por isso, Moscou não deixará de interferir na política ucraniana.


É preciso que a Ucrânia se parta, com o Leste simpatizante dos russos para um lado, e o Ocidente, onde a maioria das pessoas fala ucraniano, para outro? A resposta, como tudo na Ucrânia, depende também do fator russo.

Os alicerces de um país que só se tornou independente após a queda da União Soviética, estão a ser postos. A Ucrânia combina territórios que foram do Império Austro-Húngaro, no Ocidente, com zonas onde a maioria das pessoas fala russo, no Sul e no Leste.

 

As tensões étnicas refletem-se na política: há uma coincidência quase perfeita entre as zonas onde são maioritários os falantes de russo e os resultados das últimas eleições presidenciais, ganhas por Viktor Yanukovych. Refletiram-se também na onda de violência: no Sul e no Leste, há relatos de que titushky, milícias privadas que apoiam a polícia, estavam a colaborando na repressão dos protestos. Nas províncias do Leste, que faziam parte da República Socialista Soviética antes da II Guerra – antes do resto de o território ter sido anexado pelo Exército Vermelho – Yanukovych, um filho da região, é menos impopular do que no resto do país.

A especulação sobre as tensões foi reforçada com notícias de que Vladislav Surkov, um conselheiro do Kremlin que lidou com as regiões separatistas da Geórgia Abkházia e Ossétia do Sul foi visto em Kiev e na Crimeia, diz a revista The Economist. E o presidente do parlamento da Crimeia sugeriu que a região poderia separar-se do resto do país. Ali está estacionada a frota russa do mar Negro e dois terços dos habitantes são russos étnicos.

Em Moscou, traçam-se cenários de contingência prevendo a divisão do país, relata o jornal Christian Science Monitor. Andrei IlIarionov, um ex-conselheiro econômico do Presidente Vladimir Putin, enumerou as opções possíveis no seu blogue – e a fratura da Ucrânia não é, de todo, algo que assuste os russos.

O cenário preferido de Moscou, e que tentou forçar até agora, é a imposição de um governo autoritário em Kiev, do gênero do de Vladimir Putin e dependente em termos econômicos e políticos da Rússia. Uma guerra civil poderia levar à divisão permanente da Ucrânia, com a parte pró-ocidental a juntar-se à União Europeia, e a mais russificada a permanecer na órbita de Moscou. Esta opção também é aceitável para o Kremlin, sugere Yllarionov. Finalmente, se a oposição sair a ganhar do atual confronto, então a Rússia poderia usar a carta de uma Crimeia separatista para gerar instabilidade na Ucrânia.

O que será certo, defende o historiador Timothy Snyder, professor em Yale (Estados Unidos) e autor do livro Terra Sangrenta – A Europa entre Hitler e Estaline (Bertrand) em vários artigos publicados esta semana, é que Moscou não está disposta a tolerar uma democracia em Kiev. É que a Ucrânia é fundamental para realizar a sua pretendida união euroasiática com ex-repúblicas da antiga URSS. Esse bloco econômico e político “tem de ser constituído apenas por ditaduras, dado que qualquer sociedade livre que a integrasse desafiaria a governação russa. Por isso, Moscou tem de ter na Ucrânia um vizinho autoritário e fácil de manipular”. (Clara Barata - publico.pt).


segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

TRÊS ANOS DE EXISTÊNCIA

PARABÉNS, "NOTÍCIAS DA UCRÂNIA" !


Hoje, 24/02/2014, o blog completa três anos de existência. (79.256 acessos)
Estamos duplamente felizes. Por um lado, pelo fato deste blog ter sobrevivido por tanto tempo cumprindo a sua missão de informar os nossos conterrâneos espalhados pelos países de língua portuguesa. Por outro, pelo novo horizonte que se vislumbra para a UKRAINA. A história lhe sorri, apresenta-se nova oportunidade para o seu destino de paz, harmonia, amor e liberdade. Que Deus abençõe a esperança do povo ucraniano!!!
Rendemos, também, a nossa homenagem especial a uma pessoa também especial: Trata-se da nossa TRADUTORA, sem a qual este blog nem teria surgido, menos sobrevivido por este tempo.
Obrigado, OKSANA! Que Deus a proteja e te dê saúde. A comunidade ucraniana lhe deve muito pelas longas horas garimpando informações nos mais diversos jornais ucranianos, pelas noites de sono perdidas, buscando as notícias para informar os 79.256 leitores que acessaram este blog nestes três anos de sorrisos, suor, mas também de lágrimas para todos nós.

Спасибі всім,
[Obrigado a todos,] 
Бог, захищати Україну!
[Deus, proteja a Ukraina!]

ALGUMAS MENSAGENS DE NOSSOS LEITORES:

Parabens bravos guerreiros, viva a liberdade, louvado seja o Nome Santissimo de Jesus e da Santissima Virgem em Parlamento escolhe presidente interino para substituir Yanukovych
em 23/02/14
Muito emocionante ver tantos lutando pela liberdade, porém, triste assistir aos seus sacrifícios. Acabei de ver o pedido de uma ucraniana que esta no youtube e confesso que me emocionei bastante. https://www.youtube.com/watch?v=nMpPS6B6phg em UCRÂNIA: AS TRÊS DIMENSÕES DO CONFLITO
em 23/02/14
Honremos cada gota de sangue e cada lágrima derramada por esse povo guerreiro que acreditou e mudou a história de seu País mais uma vez. Слава Україні! Героям Слава! em Na Praça da Independência em Kiev: “A nossa luta está a ser vitoriosa”
em 22/02/14
Queridos amigos. Hoje somos todos ucranianos. bem-hajam pelo excelente trabalho que fazem neste blog. Estou muito emocionada como portuguesa, acompanhei toda a situação em KIev,unicamente graças a vós que me proporcionaram aceder a informação detalhada e precisa na minha própria língua. Pessoas como vós são decisivas. Veicular informação é um trabalho nobre. Bem -Hajam e muito obrigada de novo ! em A BATALHA DE KIEV - II
em 22/02/14
Parabens a todas corajosas mulheres, que a Virgem as guarde. em MULHERES NO MAIDAN: DEPOIMENTOS QUE EMOCIONAM
em 21/02/14