terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Se a Ucrânia se partir, a Rússia ganhará sempre alguma coisa



Kiev é fundamental para o sucesso da união euroasiática de Putin. Por isso, Moscou não deixará de interferir na política ucraniana.


É preciso que a Ucrânia se parta, com o Leste simpatizante dos russos para um lado, e o Ocidente, onde a maioria das pessoas fala ucraniano, para outro? A resposta, como tudo na Ucrânia, depende também do fator russo.

Os alicerces de um país que só se tornou independente após a queda da União Soviética, estão a ser postos. A Ucrânia combina territórios que foram do Império Austro-Húngaro, no Ocidente, com zonas onde a maioria das pessoas fala russo, no Sul e no Leste.

 

As tensões étnicas refletem-se na política: há uma coincidência quase perfeita entre as zonas onde são maioritários os falantes de russo e os resultados das últimas eleições presidenciais, ganhas por Viktor Yanukovych. Refletiram-se também na onda de violência: no Sul e no Leste, há relatos de que titushky, milícias privadas que apoiam a polícia, estavam a colaborando na repressão dos protestos. Nas províncias do Leste, que faziam parte da República Socialista Soviética antes da II Guerra – antes do resto de o território ter sido anexado pelo Exército Vermelho – Yanukovych, um filho da região, é menos impopular do que no resto do país.

A especulação sobre as tensões foi reforçada com notícias de que Vladislav Surkov, um conselheiro do Kremlin que lidou com as regiões separatistas da Geórgia Abkházia e Ossétia do Sul foi visto em Kiev e na Crimeia, diz a revista The Economist. E o presidente do parlamento da Crimeia sugeriu que a região poderia separar-se do resto do país. Ali está estacionada a frota russa do mar Negro e dois terços dos habitantes são russos étnicos.

Em Moscou, traçam-se cenários de contingência prevendo a divisão do país, relata o jornal Christian Science Monitor. Andrei IlIarionov, um ex-conselheiro econômico do Presidente Vladimir Putin, enumerou as opções possíveis no seu blogue – e a fratura da Ucrânia não é, de todo, algo que assuste os russos.

O cenário preferido de Moscou, e que tentou forçar até agora, é a imposição de um governo autoritário em Kiev, do gênero do de Vladimir Putin e dependente em termos econômicos e políticos da Rússia. Uma guerra civil poderia levar à divisão permanente da Ucrânia, com a parte pró-ocidental a juntar-se à União Europeia, e a mais russificada a permanecer na órbita de Moscou. Esta opção também é aceitável para o Kremlin, sugere Yllarionov. Finalmente, se a oposição sair a ganhar do atual confronto, então a Rússia poderia usar a carta de uma Crimeia separatista para gerar instabilidade na Ucrânia.

O que será certo, defende o historiador Timothy Snyder, professor em Yale (Estados Unidos) e autor do livro Terra Sangrenta – A Europa entre Hitler e Estaline (Bertrand) em vários artigos publicados esta semana, é que Moscou não está disposta a tolerar uma democracia em Kiev. É que a Ucrânia é fundamental para realizar a sua pretendida união euroasiática com ex-repúblicas da antiga URSS. Esse bloco econômico e político “tem de ser constituído apenas por ditaduras, dado que qualquer sociedade livre que a integrasse desafiaria a governação russa. Por isso, Moscou tem de ter na Ucrânia um vizinho autoritário e fácil de manipular”. (Clara Barata - publico.pt).


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