domingo, 1 de setembro de 2013

VIKTOR MEDVEDCHUK: Traição dos próprios ideais

Ukrainska Pravda (Verdade Ukrainiana), 21.08.2013
Mustafa Nayem


No último domingo no final das notícias do principal canal informativo da Rússia - "Rússia 23" foi ao ar uma história interessante. Ela contou aos assistentes sobre o torneio internacional de combate "sambo", ao qual compareceram o presidente Putin e o primeiro-ministro Medvedev.

Depois da explanação da preparação dos atletas às competições o jornalista, entre outros assuntos lembrou, que como visitantes do torneio compareceram Nursultan Nazarbayev (presidente do Cazaquistão) e o lider do movimento popular "Escolha ukrainiana" Viktor Medvedchuk.

Apresentados os visitantes, o jornalista aproxima-se do visitante ukrainiano mas, ao invés de comentários sobre artes marciais no ar, inesperadamente um filme de Medvedchuk sobre União Aduaneira!

Qual é exatamente a relação entre a disputa do "sambo" e a escolha externa da política ukrainiana, é difícil de entender. Mas, o quanto parece natural a relação dessas duas questões, propomos avaliar pessoalmente.

Jornalista: Enquanto isso, os convidados se reúnem próximo ao ringue: "Viktor Medvedchuk, lider da "Escolha ukrainiana" - também é fã de artes marciais. Ele diz que o esporte na Ukraina está se desenvolvendo. Mas a economia - é outra questão".

V. Medvedchuk: "Infelizmente, aconteceu, que o governo e oposição uniram-se hoje na assim chamada escolha européia. Eu considero, como de fato, a maior parte da população da Ukraina, que isso não está certo, que o nosso vetor de integração econômica deve ser com o leste - União Aduaneira."

Jornalista: Serhii Hlazyev praticamente confirma Medvedchuk. Ele também veio torcer pelos atletas, mas se preocupa pelos vizinhos. "Ukraina hoje está envolvida no processo de integração européia, onde lhe impõem o papel de colônia. Colônia sem direitos. Se fizermos uma analogia, Ukraina, sem entrar no ringue, imediatamente perde".

Cerimônia de premiação do torneio de combate "sambo". Na foto, em pé, da direita para esquerda: Medvedev, Putin, Nazarbayev e Medvedchuk.

Em seu comentário Medvedchuk distorceu um pouco a realidade sociológica na Ukraina manifestando seus próprios desejos de "mais da metade do país". Ao longo dos últimos três anos, nenhum dos serviços sociais da Ukraina recebeu resultados, de acordo com os quais mais da metade dos ukrainianos davam vantagem a União Aduaneira sobre a adesão à UE.

Desde o início de seu retorno à política, a um ano e meio, lhe previram diferentes cenários. Primeiro vieram os rumores de sua nomeação à Embaixada da Ukraina na Rússia. Depois, que seu movimento, a "Escolha ukrainiana", crescerá como partido e participará de eleições parlamentares para se tornar lobby russo no Parlamento ukrainiano. A versão alarmante foi o suposto desejo de Medvedchuk se tornar primeiro-ministro da Criméia e com progressiva escalada do cenário russo na península separá-la da Ukraina

Obviamente, todas essas versões parecem bastante exóticas. Ao mesmo tempo tudo se resumia ao fato de que Medvedchuk foi eleito lobista-chefe para os interesses russos na Ukraina. Posteriormente, a esta hipótese surgiram convincentes confirmações.

Em julho de 2012, imediatamente após uma reunião de Putin com Yanukovych, pela qual Yanukovych esperou várias horas, surgiu na rede um vídeo alegadamente secreto, de um jantar amigável do presidente russo na casa de campo de Medvedchuk, lider da "Escolha ukrainiana" na Criméia. O fato de que Putin é padrinho da filha de Medvedchuk já era conhecido. Mas, o quanto eram cordiais as relações que ligam os dois políticos, foi demonstrado pela primeira vez neste vídeo. (ver vídeo no final da reportagem)

Primeiramente este vídeo foi apresentado pelo canal russo Live News. Acreditar que este vídeo foi realizado apenas para arquivo familiar e caiu na rede aleatoriamente, só uma pessoa muito ingênua acredita.

A demonstração seguinte das relações entre Putin e Medvedchuk tornou-se a participação do presidente russo na mesa redonda da "Escolha ukrainiana", que "acidentalmente" coincidiu com o dia da celebração de 1.025 anos do Batismo da Rus. (primeiro nome da Ukraina, roubado pela Rússia, com modificação -OK).

Com cada um desses gestos de relacionamento entre Putin e Medvedchuk os meios de comunicação russos entusiasmavam-se cada vez mais com a figura de V. Medvedchuk, cada vez destacando sua liderança no movimento social com o eloquente título "Escolha ukrainiana", o qual defende a adesão da Ukraina à União Aduaneira. O aparecimento de Medvedchuk com Putin nas competições em Sochi, no contexto de tensas relações entre exportadores ukrainianos e guardas fronteiriços russos devia dar ao espectador uma resposta definitiva para a questão, quem é o principal lobista de Kremlin em Kyiv.

Mas, se os partidários da União Aduaneira na Ukraina ou Rússia soubessem quais bases ideológicas defendia V. Medvedchuk há alguns anos atrás, dificilmente eles se alegrariam com sua escolha, e há uma grande dúvida, se até o cumprimentariam.

Fuga das próprias opiniões

Em uma entrevista com a esposa de Medvedchuk ela conta, que quando eles se conheceram, ela perguntou, por que ele, um homem bem sucedido nos negócios, envolvia-se com política, a o que ele respondeu: "Eu sei, como fazer deste país uma Alemanha ou França."

E isso é verdade. Dez anos atrás Medvedchuk, por razões sinceras ou oportunistas colocava-se como um dos mais fortes defensores da integração ukrainiana à Europa. Dada a quantidade de materiais encontrados nos arquivos da internet, é difícil acreditar, que com todo esse plano Medvedchuk conseguia esconder suas verdadeiras opiniões.

Talvez a mais autêntica cópia de opiniões da política externa de V. Medvedchuk seja a sua dissertação "Atual idéia nacional ukrainiana e atuais questões de criação de Estado", escrito na Academia Nacional de Assuntos Internos da Ukraina, em 1997. No entanto, familiarizar-se com este trabalho é impossível. Ele desapareceu. Não existe nem no domínio público da internet, nem na biblioteca da Academia do Ministério dos Assuntos do Interior, nem na biblioteca Vernadskyi. Esperamos, que qualquer dia poderemos ver este trabalho do Sr. Medvedchuk, e, se alguém guardou uma cópia, ficaríamos muito felizes de recebê-la nesta redação.

Os primeiros trabalhos sobre política externa de Viktor Medvedchuk conseguimos encontrar no jornal dos companheiros, irmãos Hryhorii e Ihor Surkis "Kyivski Novyny" (Novidades de Kyiv). Em agosto do ano 2000 a edição publicou um artigo do programa de V. Medvedchuk intitulado "Independência da Ukraina e valores europeus". O artigo foi publicado em dois números consecutivos - 7 e 8 de agosto - e praticamente todo foi dedicado a escolha européia da Ukraina.

Curiosamente, na Internet, este artigo quase não sobreviveu: na página do Partido Social Democrático da Ukraina não funciona, e o arquivo do jornal não é aberto ao domínio público. A única fonte onde ele pode ser encontrado - é - no site pessoal de V. Medvedchuk. Verdade, a partir da enumeração aberta das publicações ela está oculta, achá-la conseguiu-se casualmente através de palavras-chave, pesquisando nos arquivos do Google.

No entanto, depois de concluir a leitura do artigo, é fácil compreender, porque a equipe de V. Medvedchuk cuidadosamente esconde as palavras de seu líder de olhares indiscretos. Citamos apenas um fragmento desse material.

"Eu pertenço ao mesmo grupo de políticos ukrainianos que sempre se orientaram aos valores europeus, à experiência européia e que acreditam, que o sucesso de nossas reformas é inconcebível, se nós vamos realizá-lo fora do contexto das tendências européias, se nós vamos esquecer que Europa - é a nossa casa comum, e que a fuga do alojamento comunal soviético não significa que nós não devemos buscar a única civilizada e confortável civilização da construção européia.

Eu estou profundamente convencido de que, praticamente todos os nossos segredos para superação da nossa crise precisa procurar na Europa. Na minha profunda convicção, nós precisamos apenas, com cuidado e atenção aprender a experiência européia e adaptá-la às realidades da Ukraina.

Pode ser que nós ainda não temos fé suficiente nos valores fundamentais europeus. Nós, ukrainianos, hoje nos assemelhamos àquelas pessoas, das quais a Bíblia diz que possuíam fé suficiente para sair do reino do mal, mas não possuíam fé suficiente para entrar na Terra Prometida."

Posteriormente todas essas idéias formaram a base do livro de V. Medvedchuk: "Espírito e princípios da social-democracia: perspectiva ukrainiana", onde ele ressaltava, que a adesão de plenos direitos da Ukraina a UE é a consequência do reconhecimento de valores liberais.

Em 2002, a opção da Ukraina era declarada no programa do Partido Social Democrata da Ukraina (unido). Hoje é surpreendente lembrar que nas convenções sob os auspícios de V. Medvedchuk na sala havia pendurado um retrato do chanceler alemão Willy Brandt.

Na véspera das eleições parlamentares os partidários do PSDU(unido) promulgaram o principal programa do partido "55 teses do PSDU (unido), onde no capítulo "Política exterior" afirmava-se: "Nós partimos do fato, que Ukraina optou pelo modelo europeu de sociedade e Estado, e esta escolha não está sujeita a discussão ou revisão. O objetivo político da Ukraina - tornar-se um membro de plenos direitos da Comunidade Européia".

O documento foi publicado com a assinatura de V. Medvedchuk e seu texto, na íntegra, ainda pode ser lido no site oficial do PSDU(unido) e até mesmo baixar como arquivo.

Fuga da próprias ações

Chegando ao Parlamento, o partido de V. Medvedchuk passou das declarações ao concreto. Em 19.06.2003 o Parlamento aprovou a Lei "Sobre a segurança nacional da Ukraina", de acordo com a qual, as prioridades dos interesses nacionais da Ukraina definiam-se "integração no espaço econômico, político e jurídico europeu e espaço euro-atlântico de segurança".

Na esfera da segurança nacional a prioridade, entre outros itens foi dito "aquisição de associação na União Européia com preservação de boa vizinhança e parceria estratégica com a Rússia". Além deste parágrafo Rússia é mencionada apenas em dois contextos: "observância dos acordos sobre permanência temporária da Frota do Mar Negro" e garantia do livre desenvolvimento, uso, desenvolvimento e proteção do idioma russo e outros idiomas de minorias nacionais.

Interessante, no capítulo sobre questões econômicas a Federação Russa não era mencionada. Como prioridade da Ukraina foi determinado: "aprofundamento da integração do sistema europeu e mundial, e participação mais ativa em organizações econômicas e financeiras internacionais".

Esta lei foi aprovada por 319 votos. O partido PSDU(unido) consistia de 37 deputados, votou favoravelmente com 34 votos mas, mesmo se votasse contra - a lei seria aprovada. Foi uma escolha consciente dos social-democratas.

Medvedchuk, na época era o chefe da administração do presidente Leonid Kuchma. Mas não há nenhuma dúvida de que ele estava de acordo com os membros de seu partido na escolha européia da Ukraina. No mesmo ano de 2003 o serviço de imprensa de seu partido, PSDU(unido) anunciou o apelo de seu líder ao povo ukrainiano, por ocasião do Dia da Europa.

Os apoiadores de hoje de V. Medvedchuk ficariam surpresos, ao ouvir, que outrora seu líder exortava os cidadãos a compreender a irreversibilidade da opção européia da Ukraina, e sublinhava que "Europa - nossa morada".

"Aderindo às celebrações gerais européias, mais uma vez ressaltamos o fato de que o país independente - Ukraina - definiu sua política interna e externa à integração européia. Este difícil caminho requer de cada um de nós uma maneira diferente de pensar e agir, respeito pela lei, recusa ao legado autoritário do passado. E, principalmente, conscientização de que Europa - é nossa morada. Nosso guia - Europa, os seus valores humanistas".

E, se compararmos todas estas teses de V. Medvedchuk com o então sentimento da sociedade, então revela-se, que durante sua permanência no poder, V. Medvedchuk literalmente estuprava os ukrainianos com suas idéias sobre a integração européia. De acordo com os dados do Centro Razumkov, no início de 2002 desejavam a integração européia apenas 26% dos ukrainianos, e desejos para aproximação com a Rússia eram 34,2%. Em comparação, hoje o quadro é exatamente oposto: a integração européia apoiam 41,7% da população, e a adesão à União Aduaneira - 31%.

No entanto, é improvável que o público russo um dia verá esses dados. É ainda mais duvidoso de que a ele serão apresentadas as opiniões políticas metamorfoseadas de V. Medvedchuk do passado.

Mas aos defensores da opção européia da Ukraina também há uma boa notícia: sobre quem realmente é V. Medvedchuk na atual arena política da Ukraina, os jornalistas russos falarão apenas nas suas fantasias mais corajosas.

Medvedchuk é, definitivamente, um dos advogados mais experientes na Ukraina. Mas, em todo o país, este fato é conhecido apenas por um círculo muito restrito de especialistas. A reputação do cardeal "cinzento" dos tempos do presidente Kuchma (Kuchma foi eleito em 1994 e reeleito em 1999 - OK) nos círculos políticos fez com que até mesmo os políticos mais proeminentes, da oposição e do poder não ostentassem sua colaboração com o Sr. Medvedchuk.

Sua popularidade entre o eleitorado potencial restringe-se a incognoscibilidade. Não ajudaram nem as centenas de milhares de cartazes com a face de Medvedchuk, que tentou promover a idéia da "escolha ukrainiana" em quase todas as cidadezinhas ukrainianas. Certamente, o aparecimento regular com V. Putin pode melhorar um pouco a situação, mas é improvável que será favorável à imagem de um político ukrainiano independente.

A única pergunta que surge: por que a escolha de experientes estrategistas políticos do Kremlin, capazes de efetivamente formar a consciência do país de quarenta milhões de habitantes, caiu exatamente sobre Medvedchuk - político pouco conhecido do passado distante, com determinada reputação que a um ano e meio atrás, encontrava-se além dos limites de marginalização?

As respostas podem ser duas: ou isto é um mito habilmente construído para exportação especialmente para V. Putin, o que é uma consequência do isolamento completo de Moscou das realidades ukrainianas. Ou outra escolha além da criação artificial da "escolha ukrainiana" os russos não tinham.

Então tudo isso confirma a marginalidade de todo lobby russo na sociedade ukrainiana.

Tradução: Oksana Kowaltschuk

Putin visitando a afilhada

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