Ou por que os ukrainianos desaparecem em vastas extensões do império russo?
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O censo de 1926 confirmou que no Cáucaso, no país do Nordeste, apesar das enormes perdas, viviam ainda mais de 3 milhões de ukrainianos. Com tão grande força cossaca o governo bolchevique, que nos primeiros anos sabiamente manipulava com prenúncios de florescimento de cultura nacional e seu renascimento nos extremos do império, precisava ter consideração. Por isso, no primeiro decênio da existência da União Soviética, de 1922 a 1932, ocorria o renascimento de Kuban.
Entretanto, aqueles que bem conheciam a deslealdade comunista e sua inconsequência, que tinham acesso às diversas decisões de secretas conferências, tinha uma boa noção que esse renascimento era temporário, tinha como meta somente o objetivo propagandistico e foi iniciado com finalidade provocativa.
Ainda na Rússia czarista Kuban, país rico doador de pão, ocupava um dos primeiros lugares no desenvolvimento de ensino e nível de alfabetização da população. Mesmo nos anos da guerra civil (janeiro de 1.920) em Kuban funcionavam 1.600 escolas primárias, 240 escolas superiores iniciais, 151 escolas de ensino médio e 124 escolas profissionais.
A revolução nacional ukrainiana de 1917 contribuiu para que, após adormecido czarismo houvesse renascimento da vida nacional e cultural ukrainiana em Kuban. A situação étnica no país, naquele tempo, favorecia o desenvolvimento e o aprofundamento desse processo. Não obstante a forte pressão de russificação que pesava sobre os "kubantsi", a população das vilas e/ou distritos, bem como das aldeias de Kuban central, no transcorrer do século comunicava-se através do idioma ukrainiano.
Por isso, desde os primeiros dias da queda do império czarista iniciou-se o renascimento da escolaridade ukrainiana, e com auxílio da UNR (Conselho Central Ukrainiano) aqui criaram-se as casas-de-leitura e a publicação de um jornal diário ukrainiano. Deste modo, o processo natural de ukrainização em Kuban iniciou-se ainda com Conselho de Kuban e República Independente de Kuban.
Sua queda e a instalação do regime soviético não conseguiram interromper o renascimento nacional em Kuban. Os bolcheviques, para não provocar uma insurgência e distúrbios em massa nesta região, foram obrigados a uma condescendência temporária. Hoje é difícil de acreditar que em Kuban, até 1932, funcionavam 240 escolas de nível I e II. Funcionava também uma inteira rede de cursos para acabar com o analfabetismo dos adultos, ensino este que se realizava em língua ukrainiana. Ainda em algumas faculdades politécnicas e institutos de medicina havia aulas em língua ukrainiana. Também em língua ukrainiana eram preparados os profissionais em pedagogia e técnicos agrários. A língua ukrainiana era usada nos órgãos da justiça e exército.
A abertura de revista ukrainiana como na Criméia, assim também em Kuban é um assunto complicado e praticamente impossível. O governo apresenta muitos argumentos quando os fracos, privados do apoio governamental, círculos sociais destes países pleiteiam o direito de editar impressos ukrainianos. No final dos anos 20 as necessidades espirituais e culturais assistiam 20 jornais e 5 revistas. Até, junto com o jornal diário do partido "Krasnoie Znamia" (Bandeira ou estandarte vermelho) editava-se um complemento ukrainiano. E VKP(b) - (Comitê do Nordeste do Cáucaso (bolchevique) editava o semanário ukrainiano "Chervonyi prapor" (Bandeira Vermelha).
No país funcionavam três editoras ukrainianas e três teatros com artistas locais. Regularmente transmitiam-se programas radiofônicos. Havia uma bem sólida organização de escritores com mais de 30 poetas e prosadores. Eles preparavam acima de 600 edições, entre artísticas, científicas, publicitárias e literatura escolar. Junto ao VKP(b) - (Comitê do Nordeste de Cáucaso bolchevique) funcionava também a seção de minorias nacionais.
Parecia que o renascimento ukrainiano em Kuban adquiria um caráter irreversível. O censo realizado em 1939 em todo país deveria fixar um extraordinário florescimento ukrainiano nesta região, entretanto "objetiva estatística soviética" atesta coisas assombrosas: o número de ukrainianos em Kuban, como nas demais regiões do império, no espaço de 30 anos, diminuiu catastroficamente. O enigmático desaparecimento de ukrainianos no território russo é uma aula histórica silenciada pelo partido comunista. Durante os 13 anos (de 1926 a 1939) a população ukrainiana em Kuban diminuiu mais de 12 vezes e, em 1939 contava apenas 150 mil (4,7% do geral).
Que bomba étnica explodiu em Kuban, a qual em 10 anos destruiu 3 milhões de ukrainianos? A cortina sobre esse segredo abrem clandestinamente as circulares de Kremlin do "pai das nações", arquivos KDBistas e algumas edições da diáspora ukrainiana, que começaram penetrar na Ukraina.
Todas estas fontes demonstram, de forma convincente, que um sangrento destroçamento do renascimento ukrainiano foi efetivado pelo governo bolchevique em Kuban e outras regiões da Rússia. O morticínio da nação ukrainiana espalhou-se em ondas sanguinárias, impulsionado por Stalin e Beria, intensamente por todo país. E, desde 1933 o total genocídio envolveu também a Ukraina. Os motivos dessa ação sem precedentes, na história da humanidade ainda devem ser exaustivamente estudadas. Entretanto, hoje já é possível afirmar que os celerados de Kremlin reconheciam que os desejos ulteriores pela independência das colônias e seu renascimento nacional ameaçaria a existência de todo sistema totalitário.
A circular de Stalin, sobre a cessação da ukrainização, pelos fantoches bolcheviques na Ukraina foi iniciada, assiduamente, em 1933. Mas, antes desta data os ukrainianos de Kuban já estavam destroçados como testemunha o revelador-mortífero documento, que surpreendentemente preservou-se no arquivo estatal. Citaremos apenas uma decisão.
"1932.12.32. Departamento Geral
Decreto. Presidium. Comitê Executivo Regional-CER.
RESOLUÇÃO do Presidium do Comitê Executivo Regional do Norte do Cáucaso de 26 de dezembro de 1932.
PROTOCOLO N 83 parte 40.
Escutaram: Sobre a Ucrainização.
Decidido: tomando em consideração que a Ucrainização de distritos e aldeias, realizada no Norte do Cáucaso na sua consequência não reflita os interesses culturais da população e serve para a classe inimiga como uma forma legal a organizar suas atividades de resistência ao poder soviético e da criação sob este pretexto de suas organizações contra-revolucionárias, o Presidium do Comitê Executivo Regional
ORDENA:
1. Suspender imediatamente a Ucrainização em todos os distritos e aldeias da região do Cáucaso do Norte.
2. Desde 1 de janeiro de 1933 em todos os órgãos do governo nas aldeias e distritos determinar a língua russa como única.
3. Durante três dias realizar a transferência de todos os jornais ucrainianos em língua russa, bem como panfletos, folhetos, jornais murais, jornal de fábrica e outra literatura, publicados antes em língua ucraniana, no futuro, para futuro
todo publicar em russo.
4. Todos os cursos de trabalho de curto prazo (estaduais, coletivos, educacionais, etc.) executar em russo.
5. Propor as providências necessárias para a Secretaria de Educação para que até outono de 1933 em todas as escolas se dê a transferência de ensino para a língua russa, nas escolas ucrainizadas fortalecer o pessoal de ensino e
apresentar as determinações para a discussão no Presidium do Comitê Executivo.
6. As transmissões de rádio em Ucraniano proibir.
7. Obrigar CER explicar esta decisão às assembléias gerais e forros dos Comitês Soviéticos.
Certo: Secretario protocolar de CER (Assinado)
Chihachev
GAKK, P-1594, OP.1,50,1.614."
Acreditamos que comentar este cínico documento não há necessidade. Conforme as normas internacionais legais, essa ação de larga dimensão não é outra coisa que genocídio contra nação ukrainiana. Os tiranos Stalin e Beria fizeram o máximo possível para que, durante alguns anos, os florescentes distritos e terras cultiváveis de Kuban tornarem-se terrenos abandonados. A testemunha ocular daqueles acontecimentos, Oles Panchenko, que salvou-se emigrando, lembra: " Em 1932 foram liquidados "Chervonyi Prapor" ( Bandeira Vermelha) e "Radianskyi Stanychnyk" (Distrito Soviético). A filial de Krasnodar da editora do governo ukrainiano, com seus subordinados e representantes em Kuban e nordeste de Cáucaso, interrompeu a distribuição da literatura ukrainiana e edições periódicas. Todas as escolas ukrainianas, instituições educacionais e culturais foram liquidadas em Kuban. Nas portas dos clubes das "Natsmen" (minorias nacionais) colocaram fechaduras.
"Em muitos distritos retiravam dos clubes e casas-de-leitura a literatura ukrainiana e a queimavam na rua. Todos os ukrainianos, que desempenharam algum papel nas atividades nacional-culturais em Kuban foram destruídos fisicamente ou deportados para trabalho escravo em campos de concentração, para variados términos". (O. Panchenko em "Destruição do Renascimento Ukrainiano em Kuban". Los Angeles - California, 1973, pág.80). Para prisões foram encaminhados e destruídos quase todos os escritores ukrainianos de Kuban.
Nas câmaras de torturas assassinaram 1.500 professores de escolas ukrainianas. Fisicamente também destruíram os professores de escolas médias e superiores de Kuban e os "kobzari".
Os "kobzari" (eram os criadores, protetores e tansmissores da criação nacional em formato de canções nacionais, dumas [baladas ukrainianas], recitações, cantos religiosos e também histórias e tradições populares, com execução musical própria, num instrumento chamado "kobza", "bandura" ou lira. Daí seu nome: "kobzari", "bandurysty" ou "lirnyky". Seu significado para nação ukrainiana é comparável aos poetas gregos, na antiga Grécia. Com sua criatividade os "kobzari" afirmavam a alma da nação ukrainiana e a base da moral cristã na comunidade. Muitos eram pessoas de certa idade ou cossacos mutilados nas guerras. Quando cegos faziam-se acompanhar por meninos. Sua importância foi muito grande, especialmente antes da alfabetização popular. Nos anos 1930, durante a campanha da Rússia contra o nacionalismo ukrainiano, muitos foram aprisionados e destruídos. - O.K.)
Em 1933 o governo bolchevique desferiu um golpe terrível à população ukrainiana dos distritos, nos quais, violentamente estava sendo introduzida a coletivização. Pelos distritos do Mar Negro rolam ondas de revoltas camponesas, cruelmente sufocadas. O. Panchenko, com base nos depoimentos de testemunhas oculares, afirma:
"Para sufocar estas revoltas os bolcheviques armados, e destacamentos da OGPU (órgão da polícia secreta), cercavam os distritos, não deixando ninguém sair e assim condenavam todos à morte, porque todos os alimentos, inclusive grãos para semear, foram confiscados e retirados. Também o gado. Os cadáveres dos mortos apodreciam porque não havia ninguém para recolhê-los". (O. Panchenko, livro citado, pag.83).
Mas, ao mesmo tempo em que as aldeias ukrainianas e os distritos de Kuban morriam de fome, nos portos da Ukraina, Novorossiysk, Eysk, Tuapse, com o pão saqueado da Ukraina e Kuban carregavam os navios e exportavam para Europa Ocidental e até China.
A coletivização e o "holodomor" (morte pela fome) em Kuban tiraram a vida da metade da população cossaca. Aqueles que sobreviveram ao "holodomor", como gado eram colocados em vagões de carga e enviados "para reeducação" à Sibéria, a Primorsky e ao Extremo Oriente. Os desafortunados distritos foram povoados com os recém-chegados aldeões da Rússia e veteranos do Exército Vermelho. O distrito Popovychiv foi povoado com ciganos.
Os sobreviventes do "holodomor" e repressões, já no Norte do Cáucaso, de acordo com o censo de 1939, tornaram-se "de língua russa". O mesmo caminho que os ukrainianos trilharam em Kuban, percorreram os ukrainianos em quase todas as regiões do império comunista - Volga (área adjacente ao rio Volga), Stavropol, Don, Cazaquistão, Kurschyni, Voronezh, Sibéria, Altai, Extremo Oriente e Primorsky. Lá eles foram contados como russos. Esperemos que os futuros pesquisadores dos paradoxos demográficos e cataclismos étnicos encontrem comprovação documental da indicada anomalia. Porém, a prova mais importante são os dados do último censo (1989) da população, os quais provam, de forma convincente o fato inegável, a existência do genocídio comunista no império contra a nação ukrainiana.
Deste modo, durante 75 anos, na mais cruel história da humanidade, no império comunista, sob o lema do proletariado internacional, amizade de nações, desinteresse de "irmão mais velho" e criação de "nova comunidade histórica - da nação soviética" ocorria total assimilação e russificação de minorias nacionais. O encargo especial de opressão e destruição recaiu no destino da nação ukrainiana. Àqueles que querem contestar ou negar esta verdade, sugerimos que respondam à pergunta: como a grande diáspora ukrainiana na Rússia realiza seus direitos nacionais? Pode-se ter certeza, que para esta pergunta nem os governantes russos, nem os "patriotas" que constantemente choram pelos direitos russos em todos os recantos do antigo império, não darão resposta. Pois estes direitos a população ukrainiana na Rússia perdeu a muito tempo. E, talvez, não sem base, o ex-Presidente ukrainiano, em uma de suas últimas entrevistas, aos meios de informação em massa declarou: "...se nós defendemos os interesses dos russos na Ukraina, então por que nunca e em parte alguma, nem o Supremo Conselho da Federação Russa, nem o Governo russo, não colocou questão sobre a defesa dos interesses dos ukrainianos residentes na Rússia? Eu tenho a minha resposta: porque a democracia russa acaba lá, onde começa Rússia..."
O povo ukrainiano durante vários séculos , talvez até mesmo em detrimento e contrapeso a seus interesses nacionais desenvolveu acordos prioritários para desenvolvimento da cultura russa em seu solo. A independente Ukraina, membro da comunidade mundial, igual em direitos, deve exigir das autoridades da Rússia, e da comunidade mundial, ações adequadas também para população ukrainiana no território da Rússia. Se isto não for feito, então milhões de ukrainianos, que milagrosamente sobreviveram na Rússia, ao longo do interminável genocídio e desvairada assimilação, em pouco tempo desaparecerão do mapa nacional da Rússia, dissolver-se-ão no "ilimitado mar russo", como em épocas anteriores desapareceram sem vestígios dezenas de milhões de nossos conterrâneos, servindo como humus para cultura, ciência e economia russa. Até a solução desse inadiável problema a reciprocidade ukrainiana-russa continuará sem perspectivas em direção a um lado, e as falas dos novos democratas russos sobre "amizade das nações" e internacionalismo - continuação da traiçoeira demagogia comunista.
Tradução: Oksana Kowaltschuk