domingo, 1 de julho de 2012

ENTREVISTA: EDWARD CHOW FALA SOBRE O SETOR ENERGÉTICO UCRANIANO

Edward Chow: "No setor de energia o governo ucrainiano coloca-se na situação cada vez mais difícil."
Tyzhden (Semana), 31.05.2012
Zhanna Bezpiatchuk
Edward Chow
No setor de energia pátria constantemente ocorre algo extraordinário. Ou Viktor Yanukovych faz acordos com seu colega turcomano sobre cooperação no setor do gás, ou aos investidores estrangeiros que querem extrair gás de xisto em nosso país recomendam parceiros de pouco conhecida empresa. E sobre tudo isso paira a incerteza de acordos sobre o gás com a Rússia, nos quais Ukraina parece que já esgotou suas possibilidades de negociação.

"Se alguém quisesse criar um sistema energético ideal para corrupção, ele teria que ser, na aparência, igual ao que existe na Ukraina Hoje" - estas palavras pertencem a Edward Show, um dos mais respeitados especialistas internacionais de energia, que havia em seu tempo, consultado todos os quatro governos ukrainianos. Este ano ele participou das audiências recentes, dedicadas a Ukraina na Subcomissão dos Assuntos Europeus da Comissão dos Assuntos Externos do Senado dos EUA. O especialista americano partilhou sua visão com "Semana", sobre problemas energéticos ukrainianos.

Sombras de Kharkiv

Semana: Qual a mensagem nas audiências da subcomissão do Senado dos EUA você tentou transmitir aos colegas norte-americanos?

Chow - Fui convidado pela subcomissão do Senado. Eles queriam ouvir sobre a situação do setor energético da Ukraina, que é extremamente importante não só para seu país, mas para toda a região. Então eu propus a minha visão da situação. Todas as decisões dos problemas de energia estão nas mãos do seu governo. Isto é um fato. Estou falando não somente sobre o atual Conselho de Ministros, mas também sobre todos os anteriores. Estas decisões são bem conhecidas para seus chefes de governo. Elas foram exaustivamente discutidas por 20 anos com os europeus e americanos. O que está faltando? A vontade política de Kyiv e capacidade organizativa para reformar a política energética. Assim que Ukraina realmente decidir mudar o status quo, ela pode contar com o apoio do exterior. Se você ler o programa pré-eleitoral do presidente Yanukovych você vai encontrar tudo lá. Primeiro ele precisa normalizar as relações no setor de energia com a Rússia. E ele não fez isso. Em abril de 2010, o contrato de Kharkiv antes continuou as abordagens ruins utilizadas no passado, ao invés de pavimentar o caminho para a normalização e o estabelecimento de relações regulares com a Rússia no futuro. A energética estava ligada a questões políticas que não tem relação direta com elas. Como um especialista em energia, eu acredito que tal abordagem desestabiliza os acordos, ao invés de fortalecê-los. E, apesar da retórica de descontos sobre o gás, que supostamente vocês receberam, na verdade eles nunca existiram.

Semana: Você quer dizer, que o acordo de Kharkiv não era realmente um desconto, mas aproximação de preço para o mercado europeu?

Chow - O preço do gás, que Ukraina recebeu nos termos deste acordo, era padrão na Europa em abril de 2010. Portanto, não houve nenhum desconto real, se nós compararmos quanto em 2010 pagava Ukraina e, por exemplo, Alemanha. O problema técnico é que o preço acordado em janeiro de 2009 era muito alto, superior ao do mercado. E não tem significado que Tymoshenko afirmava que havia um desconto de 20% e Yanukovych de 30%. Objetivamente o valor era muito alto. Curiosamente, Yanukovych, durante sua campanha criticava o acordo de 2009, mas o acordo assinado por ele em Kharkiv estendeu o acordo de janeiro de 2009. Isso foi feitoo ao invés de iniciar um novo acordo, mais equilibrado e mais justo para ambos os lados, como ele prometeu. Ele, até hoje concorda com as obrigações contratuais para importar mais gás do que Ukraina precisa realmente. E por que o preço de janeiro de 2009 foi muito alto? Os russos diziam que era exatamente isso que pagavam os alemães e outros europeus. Mas a fórmula européia de preços prevê seis ou oito vezes menor o preço do gás do preço do petróleo. Deste modo o preço europeu para o gás em janeiro de 2009 acordava-se com os preços do petróleo no verão de 2008, quando o ouro negro atingia o seu pico. Em janeiro de 2009 o preço do petróleo baixou. Ele custava, então 30-40 dólares. Ao governo ukrainiano não havia nenhum sentido em concordar com valor tão elevado. Presumivelmente Yulia Tymoshenko pensava que deveria concordar ao menos com algo, e depois ela mudaria isto, quando fosse eleita presidente. Além disso, os russos nunca lhes deram garantia sobre o volume do gás que eles forneciam através do território ukrainiano durante 10 anos do acordo. Todas as obrigações foram impostas ao lado ukrainiano, e muito poucas delas assumiu a Federação Russa.

Forçados à estagnação

Semana: Você acha que o problema do gás pode ser resolvido aumentando a produção de gás doméstico pela Ukraina?

Chow - Os investidores devem entender, quais serão os preços do gás. Atualmente o mecanismo de preço no mercado é desfavorável para os produtores do gás doméstico. É por isso que a produção de seu próprio gás natural na Ukraina já está em estagnação por 20 anos. Para o gás produzido em seu país, é definido com antecedência condições de perda comparando com aquelas que se aplicam às importações. Isto é diametralmente oposto ao que faz a maioria dos países do mundo. Outros países discriminam o gás importado em favor do próprio. Então Ukraina, pelos preços de hoje deveria produzir muito mais gás. Tanto os geólogos ukrainianos como os estrangeiros me disseram que vocês poderiam produzir 50% mais do que produzem hoje. O preço do gás próprio na Ukraina está na faixa de US$40-50 por mil m³. Ao mesmo tempo, o gás importado custa $400. Seus investidores não tem incentivos para investir em produção nacional, desde que obtenham, por seu gás, preço abaixo do mercado.

Semana: Acredita-se que a inclusão do investimento estrangeiro ou nacional na produção de gás doméstico e um aumento paralelo no preço não vai resolver o problema. Há um limite para aumentar as taxas comunitárias (2 vezes por exemplo). E, como afirma o primeiro-vice-ministro Valeri Khoroshkhovskyi, até o aumento de tarifas não cobre seus custos. Além disso, o governo precisará subsidiar grande parte da população.

Chow - Eu considero que este argumento é falso. Hoje, sua economia subsidia o gás russo que é muito caro. Você não precisa taxar o seu próprio em UE$400. Você pode estabelecer o preço em US$100. Isto levará a um aumento na produção de seu gás natural. Apenas a sua produção vai para cima, e isto significa, que o valor sobe a $400. A mim, como especialista em energia, surpreende muito que os preços para o gás de produção doméstica regulam-se desta forma, que seus preços são muito mais baixos que o dos importados. Exatamente por isso a produção nacional entra em declínio e estagnação. Teoricamente este gás barato deve ser destinado à população, órgãos públicos. Mas, na realidade com ele se forma o mercado cinza. Esta é a rota e o motivo de corrupção maciça no setor do gás. Se você permite, que o próprio combustível no mercado doméstico custe $50, e, importa por US$400, muito rapidamentee aparecerão pessoas, que com uma simples mágica transformarão o gás doméstico em gás importado e o venderão para certas pessoas com "corretas" ligações políticas. E tem muitas pessoas que não querem que este sistema mude, porque assim eles fazem a sua fortuna. É claro, que reformar isso é difícil. Para definir preços de mercado para o gás doméstico e importado, vocês precisarão de três a cinco anos. Mas é necessário que Ukraina comece a se mover nessa direção. Governos de Tymoshenko e Yanukovych realizaram de uma só vez, aumentos astronômicos para satisfazer FMI. Mas eles não fizeram mais nada. E isso, aliás, não tem nada a ver com a presença ou ausência de investimentos estrangeiros.

Os russos virão, e os outros?

Semana: O Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento e o Banco Europeu de Investimento não se apressam dar empréstimos ao "Naftogaz Ukraina". Eles esperam sua corporativização. Mas a tentativa anterior de fazer isso não deu certo. E o que pode acontecer se o monopólio estatal ficar sem recursos?

Chow - Eu nunca acreditei que BERD e BEI vão investir na FTS (Sistema de Transporte de Gás) da Ukraina. E a mim não interessa neste caso, quem está no poder: Yushchenko, Tymoshenko ou Yanukovych. Nenhum desses bancos de desenvolvimento aceita correr riscos. Desde o princípio, era conversa fiada por parte dos europeus, e por seus governos que os apoiavam. Enquanto Naftogaz e Ukrtransgaz nunca poderão satisfazer as condições que estas instituições impõem. Mesmo se forem corporativizados. Eles exigem garantias soberanas do governo ukrainiano. E o que vem depois? Agora, o seu país tem uma relação complexa com o FMI. O gabinete de Azarov, durante esses dois anos, se colocou na condição tal que ele é pouco capaz de solicitar e conseguir mais dinheiro. Então sobra alternativa de ir aos bancos russos e pedir fundos para pagar por seu gás. Os russos ficam felizes com o crescimento da dívida ukrainiana. Um dia eles virão cobrar a dívida. E Ukraina não terá nada para pagá-los. Moscou precisará apenas decidir que ativos ela vai querer da Ukraina em troca da dívida.. Este governo está cavando um profundo buraco debaixo de si. (Bom seria se fosse apenas debaixo dos governantes, o problema é que é debaixo da nação ukrainiana - OK). Particularmente no setor da energia. Soa como piada a intensão da Ukraina importar gás da Eslováquia, Romênia e Turquia. E o fato que mídias sérias dão isso como certo, indica um fraco entendimento do assunto. Isso não ajuda nem ao seu governo, nem, principalmente, ao país em geral. O terminal de gás liquefeito em Odessa e gás de xisto em tempo próximo, não resolverá o seu problema. Esses projetos, mesmo que sejam adotados para implementação, poderão entrar em funcionamento apenas em 5 - 10 anos. E, eu não falo apenas sobre o Partido das Regiões. O mesmo aconteceu também em 2005 e 2006, quando os responsáveis por tudo eram Yushchenko, Tymoshenko e Yekhanurov. E eu não entendo o que o governo ukrainiano quer. Ele se coloca em situação cada vez mais difícil.

Semana: O nosso governo decidiu que as empresas estrangeiras que desenvolverão jazidas de gás de xisto na Ukraina receberão parceiro de joint venture em que as partes são NAK "NADRA Ukraine" (Companhia Acionária Nacional "NADRA Ukraine") e pouco conhecida Companhia com responsabilidade limitada "IBS-Heoservis". O quanto é aceitável esta abordagem internacionalmente?"

Chow - Vamos começar com o básico. Cada país pode decidir que um investidor estrangeiro será parceiro de empresa nacional, como, por exemplo Naftogaz. O país concede ao investidor, e isto é prática normal, quando ela participa desse processo, licença para exploração de fósseis, que lhe pertencem. Mas quando anexa ao investidor uma empresa específica local - então não é típico. Quando nós falamos em parceria com empresa estatal, nós sabemos que a sua função é dar permissão. Empresa estrangeira entende isso. O investidor fornecerá tecnologias, capital, recursos gerenciais. E o que fornecerá a empresa local? Ela domina tecnologias? Se o projeto custar, vamos dar um exemplo, US$100 milhões, a empresa local vai fazer a mesma oferta que o investidor estrangeiro? Ou talvez apenas investirá US$10 milhões em dinheiro? Ou se juntará ao projeto de alguma outra forma, realizando funções com as quais o investidor não consegue lidar? Tudo isso procurará o investidor. Está tudo muito "amarrado". Ele (o investidor) não sabe, quem são aquelas pessoas. Em seu país ele poderá ser acusado de envolvimento em esquema de corrupção.

Semana: Ukraina pode obter algum benefício com a promoção de cooperação com o Turcomenistão da idéia do gasoduto Transcaspiano, que poderia ser conectado com algum gasoduto europeu?

Chow - Resposta curta - não. O objetivo de quem fala hoje sobre a construção de novos dutos, particularmentee os europeus com o seu Nabuco e outros gasodutos, - para contornar Ukraina e não incluí-la em seus itinerários. Portanto, na minha opinião, antes de tudo isto é teatro político. No caminho do gasoduto Transcaspiano que uniria Turcomenistão e Azerbaijão, há muitos obstáculos. Vantagem da Ukraina - sua localizaçãoo geográfica. Mesmo que esses projetos sejam implementados, seria no futuro, não hoje. O governo deve dedicar atenção aos assuntos sob seu controle e não se preocupar com o que pode acontecer, ou não, daqui a 10 anos. Eu posso compreender o interesse dos ukrainianos na participação em projetos de construção relacionados ao mencionado gasoduto, mas duvido que ele poderá de algum modo contribuir na soluçãoo da terrrível situação relacionada ao gás, em que se encontra o seu país.

Nota biográfica
Edward Chow - Senior Fellow do Programa de Pesquisa em Energia e Centro de Segurança Nacional de Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington. Tem mais de 30 anos de experiência na indústria de petróleo, deles 20 na Corporação Chevron. Trabalhou na Ásia, América do Sul, Europa, ex-repúblicas soviéticas. Participou das negociações para celebrar contratos multimilionários. Foi conselheiro do governo dos Estados Unidos e governos estrangeiros, corporações multinacionais, instituições financeiras internacionaiis. Sua especialização - investimentos em indústria de petróleo e gás nos mercados emergentes.

Tradução: Oksana Kowaltschuk
Foto formatação: AOliynik
Imagem: Semana

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