sexta-feira, 8 de março de 2013

1941: EXTERMÍNIO DE PRISIONEIROS NA UCRÂNIA

Extermínio de prisioneiros na prisão de Lutsk
Istorychna Pravda (Verdade Histórica), 20.07.2011
Lesia Bondaruk

Ouço, como amontoavam-se cadáveres de prisioneiros executados. Um cobriu minha cabeça com a barriga. Seu sangue escorreu pelo meu rosto. O peso constantemente aumentava. Pensei: "Se a bala não acertou, então os cadáveres sufocarão..."

"Verdade histórica" continua a série de publicações sobre o extermínio em massa de prisioneiros e detidos cometido por membros do Comissariado do Povo dos Assuntos Internos (NKVD) da URSS em junho de 1941. Na primeira parte falamos sobre o extermínio pelas autoridades soviéticas de pessoas nas prisões de Lviv, na segunda - sobre a vala comum na mina de sal na região de Lviv.
Hoje - sobre o extermínio na prisão de Lutsk, cidade no noroeste da Ukraina, capital da Província de Volyn.

Por eles chora o céu e a Terra.

Nos tempos da independência da Ukraina, em 23 de junho de cada ano, nas ruas de Lutsk acontece lamentosa procissão. Com flores e guirlandas dela participam, na maioria, pessoas de cabelinho branco. No entanto a cada ano aderem mais jovens. 70 anos já distanciam daquele dia infernal...

"Deus! O que eles fazem? Herodes? Fuzilam, arrebentam com granadas. Quem teria pensado. Bárbaros, assassinos! O mundo não viu, não soube de tal... Gente salvem-se, como quem puder!" No pátio oeste 10 - 15 minutos gorgulhava como numa incandescente caldeira. Repicavam metralhadoras, granadas explodiam.
Enquanto isso, no pátio leste um grupo de prisioneiros, cerca de 40 - 45 pessoas, correram para o portão de madeira o qual desejavam derrubar mas, sobre os fugitivos disparou a metralhadora. O pátio cobriu-se de cadáveres, inundava-se de sangue quente, vermelho. Então, de algum lugar choveram balas sobre todos nós.

Vejo, como à parede leste que era a mais comprida, rapazes espertos colocam tábuas que aqui ficaram da destruída estrebaria, e sobre elas sobem no muro, passam entre quatro fileiras de arame farpado e saltam para outro lado, para a liberdade. Muitos deles conseguiram atravessar o rio Styr e desaparecer dos olhos dos algozes.

Eu também corro ao muro, subo pela tábua atrás de um jovem, mas ele é ceifado pela bala e, morto cai sobre mim. Nós dois voamos para baixo. Neste momento a NKVD orienta-se na situação e todo fogo encaminha para os fugitivos. Eu ainda consegui levantar-me, correr alguns passoss com a cabeça inclinada por baixo do assobio de balas. Caí. Silenciei.

Ouço como sobre mim amontoam-se cadáveres de prisioneiros fuzilados. Um cobriu minha cabeça com a barriga. Seu sangue correu pelo meu rosto. Em seguida novamente - cadáveres, cadáveres, cadáveres... Alguns deles com muito peso caem sobre mim. Eu pensei: "Se a bala não me acertou então os cadáveres me sufocarão..."

Meu braço esquerdo estava tão machucado que depois, por muito tempo foi medicado. Os verdugos o tempo todo disparavam contra as pessoas que corriam para lá e para cá, como sevos recolhidos, derrubando uns a outros tentando escapar da morte. Feridos imploravam para acabar com eles. Alguém misericordioso pedia perdão de Deus e o reino dos céus, e alguém continuamente clamava por vingança. Vingança aos verdugos, assassinos, bárbaros.

Exatamente durante tal choro pré mortal dos feridos sobre nós surgiu uma nuvem e dela caíram grandes gotas de chuva. Neste momento, como se do céu, ouviram-se vozes: "Gente! Gente" Olhem, o céu chora por nós!"

Estas lembranças assustadoras sobre fuzilamentos na prisão de Lutsk escreveu Mykola Kudelia, o qual Deus salvou milagrosamente, para que ele carragasse esta verdade ao longo de sua vida;



  

Mykola P. Kudelia - pessoa, que milagrosamente sobreviveu durante o extermínio de pessoas na prisão de Lutsk. Todas as fotos fornecidas por Lesia Bondaruk.

Com o início de 1940 em Volyn começaram as deportações, prisões e assassinatos em massa. A Lutsk traziam os "não alinhados" de todos os cantinhos de Volyn.

Os documentos dos arquivos testemunham, que em 10 de junho de 1941 na prisão de Lutsk havia 2117 presos. Entre eles - os jovens ativistas patrióticos, ativistas da Organização dos Nacionalistas Ukrainianos (OUN), representantantes religiosos, representantes da intelectualidade científica e criativa. A todos eles planejava-se evacuar para Vologda (Rússia) e Astrakhan (Rússia). Para isso alocaram 75 vagões.

Em 22 de junho, cerca de 14:00h, a prisão de Lutsk foi bombardeada por aviões alemães hostis. Após o bombardeio os prisioneiros se amotinaram. Mas escapar só conseguiram alguns. Na busca dos fugitivos saiu a NKVD que fuzilava os fugitivos no local ou devolvia-os à prisão. O sargento da segurança estatal Stan, e outros funcionários da NKVD, nos memorandos ao responsável pela administração prisional da NKVD na região de Volyn comunicavam que em 23 de junho de 1941, em relação ao combate próximo a Lutsk, foram liberados os menores de idade, denunciantes e os condenados por crimes menores, no total de 84 pessoas, e os prisioneiros restantes, 2.000 pessoas, foram fuzilados no território da prisão de Lutsk.

Esta questão suja executou o grupo operacional de funcionários da UNKVD (Administração da NKVD) da Província de Voluyn sob a direção do capitão da Segurança de Estado Rozov, de composição pessoal 233 da escolta do regimento do exército da NKVD, equipe gestora e supervisores da prisão. Os fuzilamentos realizados com base na directiva do Comissário do Povo da Segurança de Estado URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) Merkulov, N° 2445, de 23.06.1941, de acordo com a qual às pessoas detidas nas prisões das províncias ocidentais da Ukraina, montavam-se listas, pelas quais estavam sejeitas ao fuzilamento, em seus locais de detenção, em relação ao início da guerra com a Alemanha. Fuzilavam não só as pessoas que foram condenadas à pena capital, mas também os condenados à privação da liberdade, e aqueles contra os quais mal começou a investigação.

 
 
Réquiém pelos mortos. Lutsk, verão de 1941.


Durante toda a noite até a manhã de 23 de junho, enquanto os alemães não entraram na cidade, na prisão de Lutsk fuzilavam os prisioneiros e com pressa recolhiam seus corpos. "Nós, de imediato, começamos juntar os cadáveres. Todos os mais de 70 condenados a pena capital, os já privados da liberdade e aproximadamente 800 em investigação foram por nós enterrados e no lugar dos cadáveres foi derramado querosene e ateado fogo. Depois, todos esses lugares foram cobertoos com cal..." - Do relatório do sargento Stan aos superiores.

O chão e as paredes da prisão estavam encharcados de sangue. Na prisão de Lutsk foram fuzilados mais de 2.000 habitantes de cidades e aldeias de Volyn. Na prisão ainda permaneceram 625 pessoas vivas.

Pelo quê? Pela Ukraina!

(A partir do século XIV as terras ukrainianas passavam para o domínio da Polônia e Lituânia. Em 1569 houve o acordo da Polônia e Lituânia-Rus (Rus era o nome anterior da Ukraina. A Rússia atual denominava-se Moscóvia). A partir desta data a Polônia ativamente reforçava seu domínio em prejuízo de direitos dos ukrainianos. Então, o "hetman" Bohdan Khmelnytskyi (hetman - líder dos cossacos) fez acordo com os moscovitas esperando que estes cumprissem o acordado e ajudassem os ukrainianos na luta contra os poloneses. Foi o chamado Acordo de Pereiaslav, de 1654, que previa mútua colaboração. Os moscovitas, gradualmente, desrespeitavam o acordo e com a morte de Bohdan Khmelnytskyi as terras ukrainianas foram definitivamente divididas entre Polônia e Moscóvia. - OK).

As repressões em massa que envolveram a população das regiões ocidentais e a coletivização forçada geravam sentimento anticomunista entre a população que ia maciçamente para a Organização dos Nacionalistas Ukrainianos (OUN)) - para lutar pelo Estado da Ukraina independente e unida. (É por isso que os russos, e seus simpatizantes ukrainianos, até hoje abominam o lider da OUN, Stepan Bandera e seus seguidores - OK).

O surgimento da OUN (e mais tarde UPA - Exército Insurgente Ukrainiano - OK) na arena política da Ukraina foi em conformidade às derrotas dos movimentos de libertação nacional das primeiras décadas do século XX, à escravização da vez da Ukraina pelos países estrangeiros, atualização da questão da Ukraina na política dos países europeus na véspera da fase inicial da II Guerra Mundial, e em relação a isto - intensificação da luta pela independência e unidade da Ukraina.
O período de setembro de 1939 a junho de 1941 acompanhava-se pela formação da organização bastante vigorosa, clandestina da OUN. De acordo com as informações dos documentos do arquivo da direção da OUN de Volyn, os nacionalistas iniciaram os preparativos para o levante que deveriam concluir até a primavera ou verão de 1941.

O dirigente da executiva regional da OUN Ivan Skopiúk foi encarregado de reforçar a formação militar entre todos os membros da OUN, formar grupos de batalha. Até 20.03.1940 para Ukraina transferiu-se parte de quadros dirigentes da OUN, os quais, no lugar, deveriam determinar as prerrogativas da organização dos trabalhos em futuro próximo.

Os próximos movimentos dos líderes clandestinos na URSS foram resultado de decisões tomadas pela Assembléia Revolucionária da OUN em 10.03.1940. Planejava-se que os recém-chegados quadros seriam os organizadores da insurreição nacional na Halychyna e Volyn.

   
 
Local provável de sepultamento.

Preocupados com a intensificação da ativização da OUN e esquentados relatórios de seus agentes estrangeiros sobre a preparação de uma insurreição geral dos nacionalistas para abril-maio de 1940, os serviços especiais soviéticos realizaram aprisionamentos em massa de todos os supostos envolvidos no movimento clandestino.

Os mais vigorosos ataques foram infligidos aos centros da OUN nas provínciais de Lviv, Ternopil, Rivne e Volyn. Às prisões foram encaminhados 658 membros da OUN, inclusive seis membros do Conselho Executivo, membros dirigentes provinciais e distritais, líderes do movimento da cidade de Lviv. Aos "inimigos do sistema soviético" pertenciam todos os ex-membros que operavam nos tempos do domínio polonês, nas organizações dos partidos legais, nacionais, religiosos e da juventude anteriormente condenados pelas autoridades soviéticas, membros das famílias de fuzilados pelos bolcheviques "contra-revolucionários" e cidadãos que possuíam parentes no exterior, outros.

O funcionamento de prisões era determinado pela NKVD--SRSR (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) de 11.12.1939 e URSS (República Socialista Soviética Ukrainiana) a partir de 25.12.1939. "Sobre a Declaração de Estado geral das prisões da NKVD-SRSR. Particularmente, na situação de abril de 1941 em URSS havia 62 prisões, delas 26 na Ukraina Ocidental.
Escondendo-se atrás da tese "agravamento da luta de classes" os órgãos da NKVD lançaram nas províncias ocidentais medidas de larga escala de seu "isolamento", acompanhado de prisões, fuzilamento, degredos por motivos nacionais, religiosos e indícios da posição social.

Em 1939, retirando-se diante dos nazistass de Hitler, os poloneses simplesmente deixaram as prisões assim como estavam, em consequência do que muitos prisioneiros políticos daquele tempo puderam salvar-se. Recuando em 1941 o governo soviético destruía seus prisioneiros em Lutsk, Ternopil, Dobromyl, Sambor, Drohobych, Stanislav (hoje Ivano-Franquivsk), Dubno, Kovel - em 35 cidades, o que representou mais de 20 mil pessoas fuziladas.

Memória e admoestação

O ex-prisioneiro de Lutsk, Ivan Hedz, lembra que vindo à prisão de Lutsk os alemães ficaram pasmos. "No início os alemães não mexeram em nada, mas tiraram muitas fotos. Depois trouxeram um padre católico que rezou pelos mortos. Cavaram um buraco sob a parede e jogaram para lá os corpos. Os seus supliciaram, os inimigos enterravam... Aqueles prisioneiros que tiveram a sorte de sobreviver os alemães não detiveram".

Depois de alguns dias quando a posição dos alemães em Lutsk fortaleceu-se, eles permitiram entrar até os poços sangrentos da prisão.
"Desde a Catedral da Trindade as pessoas, cujos parentes foram fuzilados, com mais de 70 padres vieram em procissão até a prisão. Lá eles rezaram a missa de réquien e colocaram as coroas de flores", - conta a moradora de Lutsk Nadia Klishchuk.
Foi criada uma comissão, a qual em julho de 1941 e com a ajuda da comunidade fizeram aterros sobre os túmulos, cobriram com relva e instalaram as cruzes de carvalho protegendo-os com uma cerquinha baixa. Colocaram placas com inscrições indicando o número de prisioneiros enterrados - respectivamente 1.200, 800, 300, 1800.

 
Túmulos próximo a prisão de Lutsk - Verão de 1941
Por iniciativa da Comissão no último domingo de agosto de 1941 realizou-se um funeral oficial, colocação de guirlandas e missa de réquien. Esta foi a última missa neste lugar até 1991, quando da iniciativa da comunidade, nos três locais onde foram enterrados os presos, foram colocados memoriais e placas.

Depois da Libertação de Lutsk em 1944 a prisão novamente utilizava-se pelo governo soviético até 1958. Mykola Kudelia, em seu livro, reporta-se à história de I. Manuilyk, o qual em 1944 era prisioneiro em Lutsk, viu estes túmulos e testemunhou como, por ordem da NKVD nas quatro sepulturas arrancaram as cruzes, os túmulos foram nivelados e a região asfaltada.
Depois da reforma na prisão de Lutsk, até 1998, abrigava-se a Escola de Música. Todo este tempo, neste local de tristes recordações, soava música. E quando a Escola de Música mudou-se para outro prédio, este ficou vazio.
Em 25.09.2001 aqui foi fundado o Monastério da Natividade. Para instalação da igreja separaram três pequenas salas. A primeira liturgia foi realizadaa em 18.12.2001

No outono de 2009, no território da prisão de Lutsk, começaram os trabalhos de exumação para identificar os restos mortais de prisioneiros fuzilados em 22 e 23.06.1941, o que realizava a empresa comunal do Conselho Provincial de Lviv "Dolia" (destino), para pesquisar os enterros dos participantes do movimento de libertação nacional e vítimas de guerras, deportações e repressões políticas.
Procedeu-se a exumações antecedidas por longas pesquisas, atividades exploratórias, coleta de relatos de testemunhas oculares daqueles acontecimentos. O chefe do departamento de defesa da herança cultural do Conselho Municipal de Lutsk foi um dos iniciadores das escavações. Serhii Hodlevskyi afirmou: "No transcorrer da investigação os especialistas estudaram minuciosamente o livro de memórias do antigo prisioneiro Mykola Kudelia "Sob os muros da prisão de Lutsk", relatório sobre a pesquisa arqueológica liderada por Sviatoslav Terskyi, o que realizaram ainda em 1991. Também organizaram a vinda da testemunha daqueles trágicos acontecimentos Hrehorii Pokotyl, que deu testemunho na Procuradoria de Lutsk, e estudaram documentos de arquivo.

Hoje sabemos sobre quatro valas comuns no território da prisão de Lutsk e inúmeros sepultamentos únicos. Informações isoladas nos forneceu a procuradoria regional, porque em julho de 1989 lá pleitearam, segundo declarações de cidadãos, uma investigação criminal pelo fato de fuzilamento de prisioneiros na prisão de Lutsk.

 
Nastia Volchkovych procura entre os fuzilados o sobrenome de seu bisavô Volodymyr Bondaruk

Os trabalhos de exumação em junho de 2010 foram suspensos, sua continuação planeja-se para abril de 2012 (Não vi nenhuma notícia nos jornais do ano passado - OK). Os lugares apontados dos enterros em massa não foram encontrados. O grupo de pesquisa, em um lugar encontrou, à parte, ossos humanos, o que permite afirmar, que no período pós-guerra o local dos enterros pode ter sido destruído, e os restos osteológicos retirados e levados em direção desconhecida.
Em outrpo local foram descobertos restos de 281 pessoas. Segundo palavras de Serhii Hodlevskyi a esperteza confirmou que estes restos mortais pertencem a prisioneiros de guerra soviéticos que permaneciam no campo de concentração nazista em Lutsk e morreram no início de 1942 de fome e doenças. Em 22 de junho de 2010 realizou-se o enterro desses corpos na colina Hnidovska em Lutsk.

Tradução: Oksana Kowaltschuk
Fotoformatação: A.Oliynik

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