História de "conceitos". Como Donbass tornou-se região
industrial da Idade Média
Istorychna Pravda (Verdade Histórica), 25.01.2013
Denys Kazanskyi
Primeiramente sobre a região chamada Donbass:
Istorychna Pravda (Verdade Histórica), 25.01.2013
Denys Kazanskyi
Primeiramente sobre a região chamada Donbass:
Donbass é uma região industrial que compreende a região de Donetsk, sem o Mar de Azov, o leste de Dnipropetrovsk, o sul de Luhansk (Ukraina) e o oeste da região de Rostov (Rússia).
O estreito entrelaçamento de interesses e recursos econômicos das Províncias de Donetsk e Luhansk condicionaram à informal união a única região denominada Donbass.
Donbass - principal base de energia das regiões central e sul da Ukraina (Dnipropetrovsk, Zaporizhia, Donetsk, Luhansk e região de Rostov na Rússia).
Área - aproximadamente 60 mil km²
Principais centros de produção: Donetsk, Krasnoarmiisk, Makiivka, Lysachansk, Horlivka, Pavlohrad, outros.
Grande centro da indústria do carvão, metais ferrosos e não ferrosos da metalurgia da Ukraina.
Agora vamos ao texto:
Esta prática de escavações ilegais era única. No ermo pós-soviético emergia um novo país. Nas cidades mineiras de Donbass, o Estado ukainiano não age como tal desde a sua proclamação. A região vive de acordo com leis criminais, não escritas, da máfia do carvão e a muito tempo sendo um estado praticamente independente, uma espécie de enclave dentro da Ukraina.
No Donbass age "adat" - assim nos países islâmicos denominam o conjunto de costumes e prática jurídica nacional em diversas esferas de relacionamento. O "adat" de Donetsk também é usual chamar de "conceito" mas esta palavra muitos entendem em um sentido muito estreito, correlacionando-o apenas com o mundo do crime.
Na verdade, segundo "inteligência", no espaço pós-soviético vivem não apenas elementos criminosos, mas a grande maiorira é das chamadas "pessoas comuns". E isto apesar de soar como um grande paradoxo - não é o medo perante a lei mas, exatamente o "conceito" frequentemente impede as pessoas de cometer estes ou aqueles crimes.
O exemplo mais comum de uso do "adat" de Donetsk (conceito) - na esfera da roubalheira. O Código Penal insiste que roubar, em princípio, não pode. Não se detem nas especifidades e circunstâncias do roubo. Esta abordagem, é claro, não atende os moradores de Donbass.
Roubar do Estado nunca foi considerado crime. Julgamento imparcial e burocrático, desde o início, não agradou os simples cidadãos de Donetsk, portanto o sistema de aplicação da lei oficial aqui sempre foi percebido como aparelho repressivo hostil. Muito mais justos e cordiais eram as regras "vitais", que em determinados casos justificavam o roubo, em outros - veementemente condenavam, dependendo das circunstâncias.
Por exemplo, roubar do Estado nunca era considerado crime no Donbass. Segundo "conceitos" tal roubo não somente não se condenava, mas até mesmo era bem recebido. Considerava-se e considera-se até hoje: pessoa, que rouba o Estado, simplesmente recupera o seu. Então as pessoas de Donetsk reagiam contra os bens do Estado sempre em frente única..
Talvez, justamente com esta atitude ao sistema legal estatal esconde-se a raivosa popularidade da nação à lírica prisional. Gosto pela música de pouco valor do submundo de criminosos russos, o "blatniak" e o "chanson" - uma espécie de dissidência nacional, protesto contra policiamento, contra sistema.
Mas depois do colapso da URSS Donbass - como quase todo o espaço pós-soviético - encontrou-se, realmente, em condições anárquicas. Nas condições que se formaram os "conceitos", praticamente não se chocavam com resistência ao sistema legal, e rapidamente substituíram as leis.
Ukraina independente começou viver pelo "adat". Em cidades mineiras, no primeiro plano sobressaiu a força. Aqueles que caíam, com satisfação foram empurrados, os fracos - substituídos.
Sobre as ruínas do Estado soviético, algum tempo reinava o caos. As alavancas da administração assumiram os criminosos locais, que apressaram-se na divisão das fábricas estatais. E, ao mesmo tempo, milhões de cidadãos, que ficaram sem a babá totalitária encontraram-se diante da necessidade de sobreviver por conta própria, sem ajuda de ninguém. Em Donbass o processo da sobrevivência teve sua própria sobrevivência específica ajustada para colorido local.
Nascimento de um país livre
Após a crise econômica dos anos 90 muitas pessoas nas cidades e aldeias mineiras ficaram sem trabalho. As minas foram fechadas uma após outra, pararam as fábricas, e as pessoas, ou abandonavam as cidades depressivas, ou procuravam encontrar novas fontes de renda.
Os antigos mineiros que perderam seus empregos nas minas, para alimentar a família, começaram cavar o carvão por conta própria, com a ajuda da picareta e pá.
Conhecendo a localização de camadas de carvão, eles apressadamente equiparam pequenas minas artesanais e, sem alarido, começaram produzir carvão, com o qual comerciavam e aqueciam as próprias casa. Os volumes de produção eram pequenos, mas suficientes para sobrevivência. Produção artesanal - na verdade roubo do subsolo, mas de acordo com os "conceitos" pegar do país, a consciência não atormentava ninguém.
As áreas de extração ilegal concentravam-se em áreas onde o carvão localizava-se próximo da superfície e era fácil obtê-lo. Na província de Donetsk - são as cidades _ Shakhtarsk, Torez, Yenakieve e Snizhne. Na província de Luhansk: Stakhanov, Zorynsk, Krasnyi Luch e toda região de Perevalskyi.
Yura Sukanov, 14 anos,
tornou-se herói do filme documental "Mina nº 8" produzido em 2007. Ele
trabalhava numa escavação, para alimentar suas irmãs (na foto). Na Ukraina atual
têm medo de mostrar o filme, e Yúra ainda foi espancado.
Esta experiência foi única. No pós-soviético baldio, em Donbass, emergia e se fortalecia um novo país, que se desenvolvia em paralelo com o já existente. Uma república mineira livre, que se construía sobre os princípios do capitalismo anárquico (anarquismo libertário). Nesta república não havia dirigentes, nem inspiradores ideológicos. Ela se desenvolvia espontaneamente, de baixo, como convém a um estado verdadeiramente anárquico. Os exploradores de carvão faziam sempre novas escavações, que forneciam sempre mais combustível. Quaisquer impostos não se mencionavam.
Leis, código de trabalho, segurança - tudo foi abolido na livre república mineira, que abrangia regiões carvoeiras. No início dos anos dois mil desenvolvia-se rapidamente a ultraliberal economia, não sofrendo, praticamente nenhuma intervenção do governo.
Naqueles tempos difíceis os mineiros socorriam a si próprios, seguindo regras não escritas, que trabalhavam melhor que a legislação.
Com o carvão produzido, por exemplo, ajudavam as escolas que congelavam de frio, e instituições públicas, não esperando apoio governamental. Apoiavam os idosos solitários que não podiam escavar o carvão do Estado - tais casos são descritos no filme documental austro-alemão "A morte de um trabalhador", dirigido por Michael Hlavolhera.
Filme sem legendas gravado em língua russa
Série "Morte do trabalhador", dedicada às
escavações de Donbass, denomina-se "Heróis".
Com autonomia do país, em Donbass existia completo ramo econômico - um ramo verdadeiramente popular, e o estado, não tendo possibilidade de propor aos mineiros outra alternativa fechou os olhos aos flibusteiros do carvão.
Falta de organização. A autoridade é ocupada por bandidos.
Mas no início do ano dois mil a situação mudou. A formação de bandos legalizou-se e fundiu-se com o poder compartilhando grandes e médias empresas. Atraiu atenção de grupos e extraordinário negócio popular de carvão, do qual, anteriormente, ninguém ouviu.
A atividade de escavações ilegais atingiu proporções consideráveis - e os bandidos facilmente calcularam, que em todo Donbass, nas escavações "ilegais" produzem-se milhares de toneladas do precioso combustível. A operação de extração artesanal entrou em circulação.
Aos proprietários dos buracos cobriram com tributos e obrigaram entregar o carvão à estruturas criminais intermediárias. Os mais valiosos trechos de carvão levaram para si os representantes de órgãos policiais e das prefeituras, ou para ser exato - a criminalidade, que tornou-se autoridade e apropriou-se do jovem Estado ukrainiano.
Os mineiros não tinham a quem reclamar - sua atividade era formalmente ilegal, segundo os "conceitos" tiveram que renunciar diante da força e submeter-se.
O apropriado estado rapidamente submeteu a si o campo de mineração, rebaixando os livres mineiros ao mais costumeiro a eles status de escravizados trabalhadores. Com o gerenciamento da mineração ilegal ocuparam-se: promotoria, milícia, Serviço de Proteção da Ukraina, deputados dos Conselhos Municipais, prefeituras e alguns empresários.
Seus "conceitos" já, um pouco, se distinguiam do "adat" dos mineradores - cavar "buracos" permitiram-se, diretamente sob os prédios de apartamentos, escolas, cemitérios. Onde quer que surgisse a perspectiva de dinheiro. Todos os ramos do governo subordinaram-se apenas para um propósito - pilhagem do subsolo ukrainiano, absolutamente cuspindo nos protestos da comunidade.
Hoje, os distritos mineiros das províncias de Donetsk e Luhansk - simplesmente paraíso para investigação sociológica e etnográfica. O material aqui é suficiente para várias dissertações. Olhando como se desdobravam os acontecimentos no Donbass, atrai simular a situação em que uma livre república mineira continuaria seu desenvolvimento e materializar-se-ia em novas capacidades.
Versão alternativa
Sob certas circunstâncias tal versão do desenvolvimento da história poderia tomar uma rota alternativa não somente da região de Donetsk, mas de toda Ukraina, tornando-a um país de iniciativa privada.
Quase um século atrás o poeta Oleksandr Blok, que visitou Donbass, denominou-o "América russa", observou que os migrantes criavam novas fábricas e cidades no meio do deserto - assim como aconteceu nos EUA. Uma situação semelhante repetiu-se depois de muitos anos, quando os moradores, perdendo as bases de sobrevivência, foram novamente obrigados começar praticamente do zero a vida no pós-soviético terreno baldio.
A fortalecida república mineira poderia perfeitamente seguir o caminho dos estados norte-americanos. A espontânea e selvagem extração de carvão se assemelhava a corrida de ouro no Alasca, que em grande parte formou este estado.
Aqui também pode-se traçar um paralelo com os mineiros da California. Segundo o economista Hernando de Soto, de regras informais dos mineiros da Califórnia surgiu o atual direito de propriedade nos EUA. Para o país reconhecê-lo e implementá-lo na legislação, transcorreram mais de 100 ano e lutas (por vezes com tiros) da comunidade com aqueles que cobiçavam seus direitos e terras.
Fossem os moradores de Donbass um pouco mais capazes para auto-organização, eles poderiam ter compartilhado entre si as terras ricas em carvão, formar um caixa de mútua ajuda e definir as suas próprias regras de aproveitamento do subsolo pátrio.
De semelhante associação poderia crescer forte e independente economia, que se baseia no princípio liberal da igualdade, nas oportunidades iniciais e concorência leal entre seus membros. E quem sabe, se não seria ela mais forte e mais efetiva que o apodrecido aparato burocrático estatal dos tempos soviéticos, que adotou a seu serviço o novo Estado ukrainiano.
Fosse o que fosse - na independente república mineira não surgiu o principal. Capacidade de organização e autodefesa. Extraindo carvão, o mínimo não pensavam sobre as perspectivas de negócio ilegal, não previam que um dia, provavelmente, eles precisariam defender seus interesses - e fazer isso em conjunto é melhor ter um plano pensado.
Como resultado, os trabalhadores perderam tempo e, enfim, renunciaram sob pressão de criminosos, que conseguiram adaptar-se ao país e tornar-se governo. Legalizando-se os grupos de gangues tomaram as escavações sob seu controle, dividiram as terras adequadas para exploroção do carvão artesanal entre si e dividiram a região em esferas de influência, organizaram o próprio ramo carvoeiro, operando em paralelo com a oficial estatal.
Feudalismo no Donbass
O anarco-liberalismo nas estepes de Donetsk não veio. Em vez da soberania individual e liberdade de iniciativa privada Donbass recebeu um neofeudalismo criminal - sistema que tem todas as características de um sistema feudal medieval.
Depois de passar da exploroção do carvão artesanal para o controle de criminosos, em cada cidadezinha mineira surgia o próprio tzar e deus - o governador da máfia cujo poder era limitado apenas por senhores mais poderosos.
Normalmente, os moradores locais conhecem bem o seu "senhor" de Donetsk. O senhor feudal, por sua vez, pode comportar-se com servos, segundo critério próprio.
Não se preocupando com ilegalidade, a tal permissividade dos chefes - também segundo "conceitos", visto que "conceitos" não proibem "enganar otários" causa danos à vida das atuais aldeias e cidades de Donetsk que, com valas escavadas fornece diversos exemplos de relações dos senhores feudais com o escravizado "otário".
Como caso recente temos o acontecimento da aldeia "Pivnichne". Lá, devido as bárbaras explorações de câmadas de carvão, sob as casas na rua Kozlov começou desmoronar a base.
As casas rapidamente entraram em colapso, os proprietários do negócio de carvão ofereceram compensação monetária. Em muitos casos parecidos, os "escravos" não receberam nem a compensação mínima e não conseguem obter o justo.
Do mesmo modo decidem-se as questões da compensação às famílias dos mineiros mortos ou feridos no serviço. Normalmente, de acordo com os "conceitos", nos casos de acidente e morte estabelecem acordo monetário, e a maioria dos casos não aparece na estatística.
Afinal de contas em que se transformará o atual sistema neofeudalista. Talvez, ele caia sob a pressão massiva de cidadãos que resolvam proteger seus direitos, e iniciarão a luta contra o domínio criminal. Talvez a vida civilizada no Donbass seja capaz de organizar um fortalecido e reformado Estado ukrainiano, liderado por um governo honesto edecisivo.
Há uma alta probabilidade de conservação e legitimação da situação atual.
No dado momento nós podemos dizer com firmeza, apenas, que Donbass por longos anos, tornou-se um campo de experimentos, laboratório ao ar livre, onde agiam e substituíam um ao outro as mais exóticas formas de organização social.
Herói do filme "Mina nº8": a vida após sofrer espancamento
Em março do ano passado a cineasta estoniana Marianne Kaat apresentou o filme "Mina nº8". O filme retrata a história verdadeira de um garoto de 14 anos, Iúra, que trabalhava numa mina de Donetsk para sustentar a si e a suas duas irmãs. Os três fugiram do padrasto e mãe alcoólatra, e viviam numa casa abandonada.
Após a apresentação do filme, Iúra foi brutalmente espancado pelos vizinhos. Teve o maxilar inferior quebrado e perdeu 8 dentes. Outros vizinhos juntaram dinheiro para a primeira cirurgia.
Iúra foi muito visitado no hospital e centenas de pessoas contribuíram para outras cirurgias necessárias e seu tratamento. A cineasta também ajuda e mantem contato com Iúra e irmã desde as filmagens a seis anos. Ela comprou a casa para eles.
A irmã menor agora vive no orfanato. A mãe perdeu os direitos sobre ela. A mais velha já está casada.
Agora Iúra está no período de reabilitação, não pode trabalhar. Somente após 5-6 meses poderá colocar os dentes.
Seu amigo continua trabalhando na mina.
A União Ukraina-Helsinki de Direitos Humanos contratou um advogado para acompanhar a investigação do espancamento de Iúra.
Tradução: Oksana Kowaltschuk
Foto e videoformatação: A.Oliynik
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