As fotografias deram origem a uma discussão sobre a neutralidade de Kiev, que o Kremlin quer consagrada na lei ucraniana.
A crise da Ucrânia ressuscitou a retórica e os métodos de propaganda
da Guerra Fria, fazendo lembrar aos dois velhos antagonistas que ainda
são “os melhores inimigos”, como comentou à Reuters uma fonte
diplomática de Bruxelas.
Ontem, o
secretário-geral da OTAN, Anders Fogh Rasmussen, defendeu que a Aliança
deve responder às movimentações russas junto à fronteira ucraniana
adotando “medidas suplementares”, como a deslocação de tropas para
zonas estratégicas e a realização de exercícios militares. Em resposta,
Moscou acusou a OTAN de manipular a informação ao divulgar imagens
antigas para provocar uma reação.
O conjunto de
fotografias divulgado mostra uma grande e recente concentração de meios
de combate russos junto à fronteira da Ucrânia. As imagens, que foram
tiradas pela empresa privada DigitalGlobe entre 22 de Março e 2 de
Abril, revelam claramente aviões de combate, helicópteros, peças de
artilharia e infantaria e equipamento adequado a tropas especiais. Na
análise dos comandos da Aliança Atlântica, explicada em conferência de
imprensa em Bruxelas, trata-se de equipamento pronto a usar, como estão
prontos a entrar em ação os cerca de 40 mil homens que o Governo de
Moscou estacionou na região junto à fronteira do Leste da Ucrânia.
Segundo
os militares da OTAN, algumas das zonas onde agora está este exército
russo, estavam vazias ou praticamente vazias em Fevereiro — a base aérea
de Buturlinovka, que estava praticamente desocupada, agora alberga
dezenas de caças; Belgorod, que também estava quase deserta em
Fevereiro, tem agora 20 helicópteros e fontes citadas pela BBCB diziam
que por ser a base mais próxima da fronteira (50km) poderá ser dali que
partirá uma invasão, caso este venha a acontecer.
“Trata-se de uma
força significativa e pronta para avançar”, disse à BBC o brigadeiro
Gary Deakin, que dirige o centro de operações de crise da OTAN em Mons,
na Bélgica. “Tem capacidade para se deslocar rapidamente para dentro da
Ucrânia mal receba ordens.” As imagens, disseram as fontes, indicam que
se trata de uma força ofensiva e não de tropas em “exercício” como
defende Moscou.
O Governo russo reagiu à divulgação das imagens e
às explicações sobre elas dizendo que as fotografias datam do Verão de
2013, quando foram realizadas manobras na zona. Os russos estão a
mentir, responderam os generais da OTAN que , ao fim da manhã de ontem,
divulgaram outras fotografias com mais detalhes para “que fique claro
que as afirmações dos responsáveis russos são totalmente falsas”.
Rasmussen
disse que a OTAN deve responder com mais veemência à ameaça russa. O
reforço do patrulhamento aéreo nos Estados bálticos, o envio de
aviões-radar Awacs para a Polônia e Romênia e o reforço da vigilância
naval no mar do Norte não chegam, na opinião de Rasmussen. “Penso que
temos de tomar medidas suplementares e, de acordo com as recomendações
das nossas autoridades militares, vamos discutir o assunto nos próximos
dias e semanas.” “A reflexão [da próxima semana] poderá incluir uma
evolução dos nosso planos de Defesa, o reforço dos exercícios e o
deslocamento apropriado [de tropas]”, acrescentou o secretário-geral da OTAN que, porém, esclareceu que a Aliança Atlântica não tem sobre a mesa
uma “opção militar”. “A OTAN defende e protege os seus aliados e
adotaremos as medidas necessárias - e legítimas perante a instabilidade
criada pelas ações da Rússia — que assegurem que essa defesa coletiva
seja eficiente.”
Num discurso em tom de Guerra Fria deve
procurar-se uma frase chave que explique o que o secretário-geral quis
dizer. A frase pode ser esta: “evolução dos planos de Defesa”. Pode ter
sido ela a levar o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei
Lavrov, a introduzir a questão da neutralidade da Ucrânia na troca de
acusações de ontem.
A Rússia, disse Lavrov, quer que a Ucrânia se
mantenha um país neutro e quer garantias legais de que será assim. Em
2010, o Presidente destituído da Ucrânia — mas que Moscou ainda
considera legitimo — promulgou uma lei que excluía a possibilidade de o
país entrar na OTAN e reafirmava a neutralidade deste território que
faz parte da linha de neutrais que separa a Rússia da OTAN. O Kremlin
receia que o novo poder em Kiev ceda à pressão do Ocidente e quebre esse
pacto.
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